The Last of Us é um jogo que dispensa apresentações para quem acompanha o mundo dos games. Lançado há quase 10 anos, que serão completados em 14 de Junho, o clássico da Naughty Dog foi finalmente adaptado à TV pela HBO após anos de tentativas fracassadas – houve uma versão para o cinema engavetada, com direção de Sam Raimi e roteiro do criador da franquia, Neil Druckmann, e um curta-metragem animado pela Oddfellows, que também não viu a luz do dia.
Vista inicialmente com muito ceticismo, dada a má fama que adaptações de games para cinema ou para a televisão têm, a série de TLOU acabou sendo muito bem recebida pelos críticos mundialmente e parece quebrar esse ciclo de adaptações ruins de uma vez por todas, coisa que surpreendeu este que vos escreve e, ao menos no que tange o primeiro episódio, se provou real.
Com um orçamento alto, elenco e equipe de grande calibre – a série conta com Pedro Pascal e Bella Ramsey nos papéis principais, bem como produção de Craig Mazin (Chernobyl) e envolvimento direto de Neil Druckmann, além de uma variada gama de diretores por episódio – o The Last of Us da HBO tem a difícil tarefa de agradar não só os fãs de longa data (como eu), mas também apresentar a jornada de Joel e Ellie a um enorme número de pessoas novas que provavelmente nunca encostaram no jogo, ao mesmo tempo que expande a história original sem deixar de ser fiel a ela, cumprindo as necessidades que a mídia televisiva exige.
O piloto da série, de 1h20 de duração, abre no ano de 1968 com um debate em que cientistas discutem possíveis epidemias que causariam o “fim do mundo”. Entre palpites sobre vírus e bactérias, um dos especialistas cita como uma pandemia devastadora seria na verdade causada por fungos, em particular o Cordyceps, deixando os outros micro-organismos no chinelo.
Temos então um salto temporal e somos levados ao ano de 2003, no dia 26 de setembro, data do aniversário de Joel Miller (Pedro Pascal). Aqui já há uma grande diferença em relação ao jogo: enquanto TLoU jogo começa durante a noite e nos coloca no controle de Sarah, filha de Joel, TLoU série abre logo pela manhã e nos apresenta um pouco mais da relação pai e filha. A Sarah de série, interpretada por Nico Parker, é fisicamente bastante diferente da Sarah virtual, mas em termos de personalidade e atuação, cumpre bem o papel, o que também pode ser dito de Pedro (que, no caso, é mais parecido fisicamente com o protagonista texano).
A mudança de apresentação se prova importante já que é muito difícil se apegar à Sarah sem acompanhá-la durante o dia todo, coisa que é resolvida de forma diferente no game, afinal, estar no papel da personagem, mesmo que por apenas alguns minutos, já conta bastante para criar empatia e imersão, especialmente considerando os eventos que decorrem no fim da introdução.
O dia de Sarah se resume a conseguir consertar um relógio quebrado de Joel para presenteá-lo à noite. Nesse ínterim, vemos um pouco mais da vizinhança em que a garota vive, bem como a relação com sua vizinha, que aqui é uma idosa. Inclusive, um dos melhores planos do episódio rola justamente na casa da velhinha, que é filmada fora de foco enquanto apresenta os primeiros sintomas que a transformarão em uma Corredora (primeiro estágio de “zumbificação” de uma pessoa após ser tomada pelo Cordyceps).
A abertura passa então a seguir os beats do roteiro quase que da mesma forma que são mostrados no jogo: Joel chega em casa após um dia extenuante de trabalho, Sarah o presenteia com o relógio, mostra um filme que havia pego emprestado (Joel é um grande cinéfilo, diga-se de passagem) e adormece no colo do pai enquanto o assistem. Joel então recebe uma ligação de seu irmão, Tommy (Gabriel Luna), que está encrencado e sai para socorrê-lo. Daí em diante temos o princípio do fim. A cidade, bem como a sociedade geral, encara o mais puro caos conforme a epidemia de Cordyceps se alastra ferozmente.
Misturando recriação de enquadramentos fiéis ao que rola no jogo com algumas pequenas diferenças sutis de eventos, a introdução de The Last of Us culmina na pesada cena em que um soldado recebe a ordem de atirar em Joel e Sarah enquanto fogem de um infectado. Joel se fere levemente, mas Sarah não, morrendo nos braços do pai em uma sequência que consegue ser tão marcante quanto é na obra original e fecha, para mim, o ponto alto da adaptação, que só não consegue ser perfeita porque não tem um momento de respiro com a sequência de créditos como acontece no jogo, indo ao invés disso diretamente para o segundo salto temporal da história, 20 anos depois da morte de Sarah (e aí fica claro também que os produtores optaram por mudar os anos em que a história se desenrola para criar um paralelo: TLoU jogo começa em 2013, ano de seu lançamento, indo até 2033; TLoU série, 2003, saltando para 2023, ano de sua estreia).
Os acontecimentos do resto do episódio mostram vários dos pontos fortes da adaptação: a direção de arte é certeira no que diz respeito aos cenários, ao figurino, à iluminação, enfim, a toda a parte estética da série, que passa o feel do jogo sem causar estranheza. Destaque especial vai aos detalhes da cidade de Boston tomada pela natureza e pela sujeira dos prédios e do asfalto. Dá para ver que os produtores da série seguiram bem a referência que a Naughty Dog também tomou do livro The World Without Us, que retrata justamente quão rápida e eficientemente a natureza se apoderaria das construções humanas uma vez que nossa raça fosse extinta.
Nessa primeira parte da jornada do Joel de vinte anos depois somos apresentados a todos os outros personagens esperados do começo jogo: Tess (Anna Torv), Marlene (Merle Dandrige, a mesma atriz da personagem virtual) e obviamente Ellie (Bella Ramsey), que aparece até mais cedo do que eu esperava. É possível ver o embate entre a FEDRA e os Vagalumes de maneira breve, mas que já nos deixa curiosos sobre como será desenvolvida ao longo da temporada, bem como também vemos mais elaboração sobre o que acontece com Tess antes dela se reencontrar com Joel.
Há algumas diferenças importantes, também, em alguns objetivos, já que num primeiro momento Joel e Tess têm uma bateria de carro roubada por Robert ao invés de armas, bateria esta que seria usada para tentarem encontrar Tommy, com quem perderam contato. Aliás, eu sinceramente detestei como a trama envolvendo Robert é simplesmente jogada de lado e se torna praticamente insignificante se comparada com o jogo. Pode até ser verdade que essa parte funciona muito mais como um tutorial no game e não é a preferida de muita gente (eu incluso), mas acho impossível que não houvesse uma forma de integrá-la de forma mais elegante na adaptação. De qualquer maneira, os eventos que se desenrolam ao redor disso se encontram de uma maneira coerente, quando Marlene sugere o “serviço” de levar a “carga”, Ellie, até uma base dos Vagalumes em troca de suprimentos.
O episódio acaba com a revelação de que Ellie é imune ao Cordyceps – daí a imensa importância que Marlene dá à missão de transportar a garorta – mas eu não sei muito bem se gosto dessa cena. Por um lado, ela tenta ser razoavelmente fiel ao jogo respeitando as particularidades de ser uma adaptação de TV – retomam um personagem que já havia conversado com Joel anteriormente, cortam praticamente toda a caminhada até o local da revelação, etc -, mas no fim acabam passando uma sensação de pressa que não me caiu tão bem. Além do mais, a parte em que Joel mostra sua brutalidade contra o soldado é atrapalhada por um flashback meio brega da cena em que Sarah morre. Não havia necessidade alguma disso, já que o centro narrativo desta sequência deveria ser o fato de Ellie ser imune.
O episódio de estreia de The Last of Us, mesmo com esses pontos negativos citados acima, é na verdade bastante bom. Sua introdução tem um destaque importante e é muito bem executada, mesmo que desenrole um pouco lentamente, e isso tudo é elevado pela qualidade e cuidado postos nos detalhes menores da segunda parte, que vão dos cenários à escolha de figurino, além da trilha sonora escrita por Gustavo Santaolalla (mesmo compositor do jogo) entrar nos momentos corretos, dando a motivo melódico que acompanha trechos mais contemplativos do game e, por conseguinte, da série.
Achei praticamente todas as atuações do elenco muito eficientes, especialmente a de Pedro Pascal como Joel, que pareceu ser uma escolha muito acertada. O mesmo eu não posso dizer 100% sobre a Ellie de Bella Ramsey, ao menos por enquanto. É verdade que a atriz tem um potencial enorme que já fora demonstrado em Game of Thrones, mas eu parto do princípio de que é uma tarefa extremamente árdua recriar a Ellie de forma satisfatória quando já fui exposto à atuação impecável de Ashley Johnson nos jogos – que, pra mim, é a Ellie -; ao mesmo tempo, entendo que a atriz ainda teve pouca exposição na tela se considerarmos a importância de sua personagem. Eu posso ainda não estar totalmente convencido, mas é inegável que os pequenos detalhes como a personalidade da garota e seu linguajar já estão ali, na pele de Bella. É ver como tudo isso se desenvolverá nos próximos episódios, tenho confiança de que a atriz entregará ótimas performances ao longo da temporada.
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The Last of Us prova, por enquanto, ser uma boa e honesta adaptação de um dos jogos mais importantes da minha vida – título este que me acompanhou durante um dos momentos mais difíceis e que também reacendeu minha paixão por videogames. Quero muito ver se tal honestidade da adaptação perdura durante os próximos 8 episódios. Posso dizer que aguardo ansiosamente o próximo domingo, principalmente porque será o episódio dirigido por Neil Druckmann. Nos vemos semana que vem.
Comentários
Olha... excelente texto. Esse é um problema que eu já vinha discutindo em meus círculos de amizade ha um bom tempo. Isso fica ainda mais evidente quando percebe-se a necessidade das grandes publishers de seguirem tendencias mais lucrativas não afetam apenas o game design em si, mas também as temáticas, narrativas, e até mesmo a direção de arte dos games. Vide a enxurrada de jogos de zumbis que tivemos na geração passada... Por falar em indies, eu vejo muito potencial para que os próximos AAA inovadores saiam deles. O orçamento ainda é um problema, mas financiamento coletivo já é uma realidade. Acredito que equipes extremamente competentes e comprometidas consigam levantar fundos para levar adiante o desenvolvimento de jogos desse nível.
O sorteio vai ser ao vivo via live???
Obrigado Igor! Seja bem-vindo ao Nintendo Fusion :)
Rapaz, que texto foda! Parabéns Renan! Fico cada mais feliz em ser Nintendista em tempos como esse (apesar de ainda não ter um Switch), saber que a Nintendo rema pesado contra essa maré cheia de lixo. Recentemente o designer da BioWare, Manveer Heir (Mass Effect) compartilhou que a EA só tem foco mesmo nas microtransações, que ainda viu gente gastando 15 mil dolares com cards de multiplayer do Mass Effect 3. Pra piorar agora tem o sistema de Loot Box, que está na moda, e a Warner empolgou com o Shadow of Mordor. Loot Box pra fechar campanha ou pra tentar competir online nos jogos, pra mim isso é praticamente o fim. A única esperança que tenho nessa industria que amo tanto são mesmo nos indies, Nintendo e algumas empresas. Espero que a Activision não estrague a Blizzard, pq apesar de Overwatch ter Loot Box, são completamente cosméticos, e eu acho isso bom até, pq jogar pra desbloquear coisas visuais é muito mais interessante e prazeroso que jogar pra tentar a sorte com um item específico pra ser mais competitivo com upgrades no status do personagem.
Não aparece para você no começo do texto? https://uploads.disquscdn.com/images/b809b035a7e4e21875dfe6af44cc2d10dccbe7c3eea556e1be57fe8018d72a32.png
cadê o tal formulário do Gleam? não vi link nenhum no texto... tá mal explicado isso...
Das publicadoras de games, a EA é sem duvidas a pior. Não foi atoa que foi escolhida como a pior empresa americana por dois anos consecutivos. Não quero parecer um hater, mas é essa filosofia de shooters multimilionários, com gráficos de ponta e extorquimento de dinheiro dos consumidores é que vai fazê-los fechar as portas. Isso fica evidente com o “apoio” da empresa ao Switch, não souberam mais uma vez ler o sucesso do console, e repetem os mesmos erros de uma década: investir pesado em gêneros supersaturados. E é interessante notar como o Iwata foi capaz de enxergar uma realidade mais de uma década á sua frente, e feliz que cada vez mais empresas adotam essa estratégia: jogos de menor orçamento e maior foco no público
Agora sim vou ter meu switch o/
Sim!
Qual é a exceção "imperdoável"? Chrono Trigger?
Reativei minha conta só pra promoção kkkk
Cara, não uso Twitter. Até tenho, mas nem lembro senha nem nada. Vamos ver se tenho sorte
Parabéns à todos nessa nova empreitada, o site é promissor!
Acho que o único defeito desse game foi ter requentado muitas fases, poderia ter sido apenas a GHZ, por exemplo. Mas fora isso é impecável.
sera que agora ganho o
Precisa compartilhar no Facebook. Nos outros lugares é opcional.
Eu preciso compartilhar o sorteio pelo facebook? Ou é preciso compartilhar em outro lugar?
Felipe Sagrado escreva-se em tudo para aumenta a change brother!!!!
Você pode participar sim, só não vai poder obter os dois cupons relacionados ao Twitter. :)
Boa tarde. Eu não uso o Twitter, então gostaria de saber se isso impede minha participação ou só diminui minhas chances?
? vou seguir o Renan aqui tbm