“Numa manhã, ao despertar de sonhos inquietantes, Gregor Samsa deu por si na cama transformado num gigantesco inseto”.
Essa é a primeira frase do livro Metamorfose de Franz Kafka, publicado em 1915. O enredo se inicia com essa informação súbita: ao acordar como um inseto, Gregor é impedido de continuar com o emprego e sua família passa a se virar sem a ajuda de seu provedor. Apesar desse evento sobrenatural, a metamorfose não impede Gregor do convívio com seus pais e irmã mais nova, mesmo agora restrito em seu quarto. Nessa situação, a preocupação maior com dilemas cotidianos (como, por exemplo, a perda do emprego) faz com que essa certa indiferença do protagonista ser um inseto gigante naquele meio construa um clima inquietante enquanto se lê o livro.
O jogo Metamorphosis, desenvolvido pela Ovid Works e publicado este ano pela All in! Games, transporta essa introdução para a linguagem transmidiática dos videogames: um andar lento em seu quarto até o momento em que tudo parece gigante, ouve-se um som diferente no andar, a movimentação está diferente e o jogador se depara com duas patas estranhas na tela.
Gregor mal tem tempo de entender o que está ocorrendo quando presencia seu melhor amigo, Joseph, ser condenado por um motivo desconhecido. Gregor passa a lidar com esses dois problemas que surgiram de repente. A partir disso, inicia-se uma jornada para buscar uma torre em que, ao mesmo tempo, serve de caminho para o protagonista voltar à forma humana quanto ajudar a inocentar seu amigo.
Assim como na obra original, você não sabe em que tipo de inseto Gregor se transformou. Costuma-se remetê-lo a uma barata, apesar de o idioma original do livro (alemão) não deixar isso claro, jogo permanece com essa incerteza, pois sua visão é em primeira pessoa. Metamorphosis amplia o escopo idealizado por Kafka, pois o enredo não está mais restrito a família de Gregor, a narrativa passa a ser uma aventura em um mundo próprio, inclusive com outros insetos a interagir. A mistura entre a realidade humana e em miniatura cria uma experiência surreal que confunde o jogador propositadamente.
Boa parte de Metamorphosis envolve usar a anatomia de inseto para chegar a pontos específicos. O level design consiste em usar objetos do cotidiano como plataformas: lápis, livros, garrafas de vidro, e você sobe muito em estantes e outras mobílias. O jogo possui uma mecânica de escalada, onde Gregor, ao passar por cima de líquidos viscosos, fica com suas patas grudentas por um tempo. Há um indicador na tela que define o tempo limite em que se pode usar essa habilidade, como uma barra de stamina. Além da pular e escalar, Gregor, enquanto inseto, pode interagir com alguns mecanismos, gerando momentos de quebra-cabeças.
Os cenários do jogo constroem essa senso espacial diferente, também pelo fato de ser uma movimentação mais rápida comparada a outros títulos em primeira pessoa. Essa junção de fatores alimenta uma sensação de vertigem. Metamorphosis é uma experiência sensorial e incômoda, sobretudo pelos insetos que você encontra (devido a suas aparências e sons). Não é um jogo recomendado para quem tem ânsia ou fobia desses animais, mesmo que os gráficos não sejam fotorrealistas.
Metamorphosis é uma aventura curta de duas a três horas, um tempo de dedicação similar com a experiência de ler o livro do Kafka. O jogo expande o escopo da obra original, com isso oferece uma leitura mais ampla de temas como determinismo, burocracia, as relações de trabalho e poder, pessoas que se sentem desumanizadas perante as regras sociais. Temos uma metamorfose do que era um texto escrito há mais de 100 anos, para uma experiência jogável repleta de camadas hoje permitidas pelos videogames.
Comentários
Olha... excelente texto. Esse é um problema que eu já vinha discutindo em meus círculos de amizade ha um bom tempo. Isso fica ainda mais evidente quando percebe-se a necessidade das grandes publishers de seguirem tendencias mais lucrativas não afetam apenas o game design em si, mas também as temáticas, narrativas, e até mesmo a direção de arte dos games. Vide a enxurrada de jogos de zumbis que tivemos na geração passada... Por falar em indies, eu vejo muito potencial para que os próximos AAA inovadores saiam deles. O orçamento ainda é um problema, mas financiamento coletivo já é uma realidade. Acredito que equipes extremamente competentes e comprometidas consigam levantar fundos para levar adiante o desenvolvimento de jogos desse nível.
O sorteio vai ser ao vivo via live???
Obrigado Igor! Seja bem-vindo ao Nintendo Fusion :)
Rapaz, que texto foda! Parabéns Renan! Fico cada mais feliz em ser Nintendista em tempos como esse (apesar de ainda não ter um Switch), saber que a Nintendo rema pesado contra essa maré cheia de lixo. Recentemente o designer da BioWare, Manveer Heir (Mass Effect) compartilhou que a EA só tem foco mesmo nas microtransações, que ainda viu gente gastando 15 mil dolares com cards de multiplayer do Mass Effect 3. Pra piorar agora tem o sistema de Loot Box, que está na moda, e a Warner empolgou com o Shadow of Mordor. Loot Box pra fechar campanha ou pra tentar competir online nos jogos, pra mim isso é praticamente o fim. A única esperança que tenho nessa industria que amo tanto são mesmo nos indies, Nintendo e algumas empresas. Espero que a Activision não estrague a Blizzard, pq apesar de Overwatch ter Loot Box, são completamente cosméticos, e eu acho isso bom até, pq jogar pra desbloquear coisas visuais é muito mais interessante e prazeroso que jogar pra tentar a sorte com um item específico pra ser mais competitivo com upgrades no status do personagem.
Não aparece para você no começo do texto? https://uploads.disquscdn.com/images/b809b035a7e4e21875dfe6af44cc2d10dccbe7c3eea556e1be57fe8018d72a32.png
cadê o tal formulário do Gleam? não vi link nenhum no texto... tá mal explicado isso...
Das publicadoras de games, a EA é sem duvidas a pior. Não foi atoa que foi escolhida como a pior empresa americana por dois anos consecutivos. Não quero parecer um hater, mas é essa filosofia de shooters multimilionários, com gráficos de ponta e extorquimento de dinheiro dos consumidores é que vai fazê-los fechar as portas. Isso fica evidente com o “apoio” da empresa ao Switch, não souberam mais uma vez ler o sucesso do console, e repetem os mesmos erros de uma década: investir pesado em gêneros supersaturados. E é interessante notar como o Iwata foi capaz de enxergar uma realidade mais de uma década á sua frente, e feliz que cada vez mais empresas adotam essa estratégia: jogos de menor orçamento e maior foco no público
Agora sim vou ter meu switch o/
Sim!
Qual é a exceção "imperdoável"? Chrono Trigger?
Reativei minha conta só pra promoção kkkk
Cara, não uso Twitter. Até tenho, mas nem lembro senha nem nada. Vamos ver se tenho sorte
Parabéns à todos nessa nova empreitada, o site é promissor!
Acho que o único defeito desse game foi ter requentado muitas fases, poderia ter sido apenas a GHZ, por exemplo. Mas fora isso é impecável.
sera que agora ganho o
Precisa compartilhar no Facebook. Nos outros lugares é opcional.
Eu preciso compartilhar o sorteio pelo facebook? Ou é preciso compartilhar em outro lugar?
Felipe Sagrado escreva-se em tudo para aumenta a change brother!!!!
Você pode participar sim, só não vai poder obter os dois cupons relacionados ao Twitter. :)
Boa tarde. Eu não uso o Twitter, então gostaria de saber se isso impede minha participação ou só diminui minhas chances?
? vou seguir o Renan aqui tbm