Citizen Sleeper é um dos jogos mais interessantes de 2022. Lançado originalmente para PC, Xbox e Switch, este RPG com forte ênfase em narrativa e em mecânicas minimalistas chega ao PlayStation nesta sexta, 31 de março, completando também seu ciclo pós-lançamento com o terceiro e último DLC gratuito, Purge.
Com isso, posso afirmar também – e sem nenhum receio – que Citizen Sleeper é um dos melhores jogos que joguei nos últimos anos, principalmente por causa do quão brilhante e intrigante seu texto é. O que temos aqui não faria feio frente aos grandes livros de ficção científica da literatura mundial e isso é mérito total do criador do game, o inglês Garreth Damian Martin, PhD em literatura experimental. Citizen Sleeper é um jogo especial que tem a audácia de fazer comentários sobre a vida moderna e as implicações que o capitalismo tem sobre ela ao mesmo tempo que consegue ser um jogo surpreendentemente legal pra caramba em sua fundamentação, sendo difícil de largar antes de atingir os créditos de seus múltiplos finais.
Quando falo de mecânicas minimalistas, eu quero dizer que Citizen Sleeper realmente não sofre de excessos no que tange seu gameplay. Inspirado por RPGs de mesa, CS coloca o jogador na pele – ou, melhor, nas engrenagens – de um Sleeper, robô que abriga e emula a consciência de uma pessoa do passado fugindo da Essen-Arp, megacorporação que é “dona” do corpo do Sleeper, corpo este que foi desenhado com obsolescência programada (sim, igualzinho aos nossos celulares, computadores, televisões e diversos outros aparelhos eletrônicos).
O grosso do gameplay de Citizen Sleeper funciona ao redor de ciclos – basicamente “dias de trabalho” como na vida real. No começo de cada ciclo, nós recebemos dados com valores já sorteados e que devem ser usados para executar diversas ações do Sleeper – que pode pertencer a uma entre três classes, Machinist, Extractor e Operator – ao explorar e interagir com os habitantes da estação espacial Erlin’s Eye, ou simplesmente The Eye. Os valores desses dados ditam a probabilidade das diversas ações terem um resultado positivo, neutro ou negativo. Quanto maior o número, maiores as chances de sucesso; quanto menor, maiores as chances de algo dar errado.
Esse sistema simples consegue ser engajante o suficiente porque se alia ao fato do Sleeper ter uma data de expiração. A cada novo ciclo, o corpo do robô decai, perdendo saúde. Quanto menos saúde, menores as quantidades de dados que podemos utilizar (que são 5 no máximo, considerando que a saúde esteja em dia). Quanto menores as possibilidades de ação, menos conseguimos fazer para sobreviver. E a chave de Citizen Sleeper está justamente nisso: como sobreviver na The Eye quando estamos presos num corpo que mal funciona, tendo de compreender quem realmente somos, por que estamos ali, quem são nossos verdadeiros aliados e, mais fundamentalmente, como simplesmente ter dinheiro para obter remédio para o corpo, como obter comida – sim, você também pode passar fome – e, uma vez tendo o alimento na mesa, como executar nossas funções no máximo de nossas habilidades, trabalhando para podermos nos sustentar e também ajudar aqueles que nos são caros. E, ah, ainda por cima há a Essen-Arp querendo acabar com a nossa existência.
Os primeiros momentos de Citizen Sleeper são uma espiral de tensão e sufoco. Embora os sistemas do jogo sejam simples, levamos alguns ciclos para experimentá-los e compreender qual é a pegada do jogo. Como cada ciclo consome recursos preciosos, literalmente qualquer ação que tomemos terá alguma consequência que pode ditar o futuro da jornada e, além disso, tem toda a tensão de termos um mercenário na nossa cola. Se você já jogou Persona, isso funciona mais ou menos como o lado “social sim” da franquia da Atlus.
Por outro lado, CS também faz um excelente trabalho ao dosar essa tensão inicial. Os primeiros momentos são solitários, mas logo começamos a conhecer pessoas na estação. Cada pessoa tem sua vida, seus compromissos e suas motivações e, como suas histórias e diálogos são extremamente bem escritos, logo nos apegamos a eles e ficamos com vontade de saber mais, assim também trazendo um certo conforto frente às adversidades da The Eye. É um feito e tanto, já que Citizen Sleeper opera apenas no essencial: não há voice acting, nós não controlamos o corpo do Sleeper e não existem cutscenes… Tudo é contado a partir de texto e ilustrado pela arte dos personagens ao redor da estação. Alia-se a isso uma excelente trilha-sonora eletrônica que ziguezagueia entre o atmosférico e o tenso ou energético, pontuando cada beat da narrativa de Citizen Sleeper. Que o jogo tenha conseguido me fazer ficar engajado com isso só demonstra a qualidade de sua prosa e direção de arte.
Já ficou bem claro que o que torna Citizen Sleeper especial é a qualidade de sua narrativa. Quero repetir esse ponto porque ele realmente é o maior destaque do jogo. Ao longo da jornada do Sleeper, nós conhecemos inúmeros personagens e escolher com quem vamos passar mais tempo é essencial para ditar o final do jogo.
Eu faria um enorme desserviço se passasse mais tempo aqui expondo os eventos do jogo ou quais foram as histórias mais marcantes para mim, porque a maior graça dele está justamente em virar cada página da narrativa, como num bom livro. A prosa do jogo também é excelente por conta de quão bem tudo soa em inglês – e aí vem um grande problema: Citizen Sleeper ainda não tem localização para o português, o que é uma pena, já que você precisará ter um inglês relativamente avançado para compreender as nuances do texto do jogo. Torço para que uma hora ele receba uma atualização que suporte o nosso idioma, e também digo isso com uma enorme curiosidade, já que gostaria de ver como adaptam muitas das passagens mais complexas da aventura. Alô, pessoal que localizou Disco Elysium…
Comentários
Olha... excelente texto. Esse é um problema que eu já vinha discutindo em meus círculos de amizade ha um bom tempo. Isso fica ainda mais evidente quando percebe-se a necessidade das grandes publishers de seguirem tendencias mais lucrativas não afetam apenas o game design em si, mas também as temáticas, narrativas, e até mesmo a direção de arte dos games. Vide a enxurrada de jogos de zumbis que tivemos na geração passada... Por falar em indies, eu vejo muito potencial para que os próximos AAA inovadores saiam deles. O orçamento ainda é um problema, mas financiamento coletivo já é uma realidade. Acredito que equipes extremamente competentes e comprometidas consigam levantar fundos para levar adiante o desenvolvimento de jogos desse nível.
O sorteio vai ser ao vivo via live???
Obrigado Igor! Seja bem-vindo ao Nintendo Fusion :)
Rapaz, que texto foda! Parabéns Renan! Fico cada mais feliz em ser Nintendista em tempos como esse (apesar de ainda não ter um Switch), saber que a Nintendo rema pesado contra essa maré cheia de lixo. Recentemente o designer da BioWare, Manveer Heir (Mass Effect) compartilhou que a EA só tem foco mesmo nas microtransações, que ainda viu gente gastando 15 mil dolares com cards de multiplayer do Mass Effect 3. Pra piorar agora tem o sistema de Loot Box, que está na moda, e a Warner empolgou com o Shadow of Mordor. Loot Box pra fechar campanha ou pra tentar competir online nos jogos, pra mim isso é praticamente o fim. A única esperança que tenho nessa industria que amo tanto são mesmo nos indies, Nintendo e algumas empresas. Espero que a Activision não estrague a Blizzard, pq apesar de Overwatch ter Loot Box, são completamente cosméticos, e eu acho isso bom até, pq jogar pra desbloquear coisas visuais é muito mais interessante e prazeroso que jogar pra tentar a sorte com um item específico pra ser mais competitivo com upgrades no status do personagem.
Não aparece para você no começo do texto? https://uploads.disquscdn.com/images/b809b035a7e4e21875dfe6af44cc2d10dccbe7c3eea556e1be57fe8018d72a32.png
cadê o tal formulário do Gleam? não vi link nenhum no texto... tá mal explicado isso...
Das publicadoras de games, a EA é sem duvidas a pior. Não foi atoa que foi escolhida como a pior empresa americana por dois anos consecutivos. Não quero parecer um hater, mas é essa filosofia de shooters multimilionários, com gráficos de ponta e extorquimento de dinheiro dos consumidores é que vai fazê-los fechar as portas. Isso fica evidente com o “apoio” da empresa ao Switch, não souberam mais uma vez ler o sucesso do console, e repetem os mesmos erros de uma década: investir pesado em gêneros supersaturados. E é interessante notar como o Iwata foi capaz de enxergar uma realidade mais de uma década á sua frente, e feliz que cada vez mais empresas adotam essa estratégia: jogos de menor orçamento e maior foco no público
Agora sim vou ter meu switch o/
Sim!
Qual é a exceção "imperdoável"? Chrono Trigger?
Reativei minha conta só pra promoção kkkk
Cara, não uso Twitter. Até tenho, mas nem lembro senha nem nada. Vamos ver se tenho sorte
Parabéns à todos nessa nova empreitada, o site é promissor!
Acho que o único defeito desse game foi ter requentado muitas fases, poderia ter sido apenas a GHZ, por exemplo. Mas fora isso é impecável.
sera que agora ganho o
Precisa compartilhar no Facebook. Nos outros lugares é opcional.
Eu preciso compartilhar o sorteio pelo facebook? Ou é preciso compartilhar em outro lugar?
Felipe Sagrado escreva-se em tudo para aumenta a change brother!!!!
Você pode participar sim, só não vai poder obter os dois cupons relacionados ao Twitter. :)
Boa tarde. Eu não uso o Twitter, então gostaria de saber se isso impede minha participação ou só diminui minhas chances?
? vou seguir o Renan aqui tbm