Relato: God of War o machado e as cinzas - Neo Fusion
Relato
God of War
o machado e as cinzas
26 de outubro de 2022

No aquecimento para o lançamento de God of War: Ragnarok, no próximo dia 9 de Novembro, resolvi revisitar o título de 2018. Tal reencontro se deu após o empolgante trailer lançado há algumas semanas. Por um motivo ou outro, não gostei tanto assim de God of War na primeira vez. Mesmo assim, obviamente já entendia se tratar de um título extremamente competente e imbuído de um alto valor de produção tanto de investimento quanto de talento criativo.

Eu tive dois problemas com o jogo naquela ocasião, ao ponto em que eu comecei, na época, a falar desses pontos com amigos e jogar iscas de que o jogo era, em verdade, mediano. As iscas foram se tornando um hábito, e com o tempo a brincadeira se tornou realidade e minha memória aprendeu que God of War não era lá essas coisas. Minha mente estava bastante errada, e o título é sim muito bom.

Os dois problemas, aliás, permanecem para mim, mas não tratarei deles: um eu não tenho capacidades cognitivas para desenvolver, e o outro eu só estou com preguiça mesmo. É isso, sou um sujeito meio burro e bastante preguiçoso, mas não é das minhas vicissitudes que esse texto se trata. Eu quero falar de coisas boas. Esse texto é sobre um machado, um protagonista e cinzas.

God of War

O machado

Este texto possuí spoilers de God of War (2018) e da saga como um todo.

No original de 2005, Kratos não empunhava o machado leviatã, mas sim as famosas lâminas do caos. God of War, de 2018, é uma continuação da trama de seus antecessores, ao mesmo tempo em que é uma espécie de reboot da franquia. Encaro muito mais como uma localização, entretanto. Não entre línguas e localidades diferentes, mas sim entre dois cenários distintos para um produto que é, essencialmente, o mesmo, enquanto torna-se uma obra diferente.

O estilo de jogo de God of War (2005), o apelo para aquele tipo de violência, a forma como as cenas de corte eram pensadas, a atuação vocal muitas vezes exagerada. Tais aspectos eram bastante condizentes com o tipo de produto AAA considerado maduro naquele cenário. O original era considerado um bom jogo narrativamente e era, também, comparado com obras audiovisuais de outras mídias. Sua gameplay fazia todo o sentido de um ponto de vista mainstream para o meio dos 2000.

God of War (2018) é o exato mesmo produto; um carro chefe de uma das maiores e mais famosas publicadoras de jogos AAA, pensado para ser um videogame que tenha uma jogabilidade condizente com o contexto e um desenvolvimento narrativo também alinhado ao que se espera de um produto maduro e comparável, agora e mediante incorporação de profissionais, com obras cinematográficas. O contexto, porém, é diferente, e no fim das contas a obra em si também é.

Kratos puxando o machado em God of War

O título não é uma experiência disruptiva, nem mesmo um grande lançamento mais experimental. É um jogo muito bem feito no que se propõe: trazer uma franquia mais ou menos considerada terminada para um novo momento da Sony e da indústria. Nada melhor, então, que uma nova arma para uma nova época. O machado leviatã era, originalmente, da esposa falecida de Kratos, Faye. Ao princípio do jogo é com essa arma que o protagonista corta a árvore marcada. Depois, com essa arma seguimos a jornada (ou pelo menos a maior parte dela).

O machado tem duas funções bem definidas logo de cara; arma para combate um contra um, e também possibilidade de interação de longa distância. A primeira dessas funções é parte da principal ação do jogo, justamente batalhar contra inimigos. A segunda também, embora suas possibilidades se estendam para outros campos da coisa.

Boa parte da campanha de God of War, em termos de jogabilidade, é sobre engajar com um inimigo enquanto presta atenção aos outros, sejam os enquadrados em nossa câmera ou aqueles compreendidos como estando atrás (e nesse caso somos auxiliados pelo aviso e também por retorno sonoro). Em algum momento temos acesso a uma arma de maior controle de área, enquanto o próprio machado também disponibiliza movimentos e posturas diferentes que vão nesse sentido.

Maior controle de grupo em God of War

Meu ponto central aqui, porém, é outro. O machado é para ser arremessado. E depois voltar. Essa ação, então, é o que liga exploração e combate, dando mais de um propósito para a mesma mecânica. No combate é possível acertar inimigos distantes, congelá-los com o machado enquanto lutamos com o mesmo ou outro adversário usando os punhos. É também possível errar inimigos, de propósito ou não, e depois acertá-los por trás com a volta da arma. Tacar por um lado, andar um pouco pro outro e puxar de volta, resultando em pernas decepadas não pode ser considerado qualquer coisa senão arte & entretenimento.

Esse arremesso também dá a quem joga a prerrogativa de resolver puzzles e interagir com o ambiente. Sejam os obrigatórios para o progresso da campanha, ou aqueles ligados à espólios e baús, boa parte do diálogo espacial da jogadora com o ambiente se dá a partir do arremesso. Congelar algo, ou quebrar alguma coisa, por vezes caçar corvos; a ação passa a ser além de inerente à campanha, também ponto de contemplação dos cenários. Visualização, aliás, bastante ancorada na perspectiva do jogo.

God of War 2018

O bom de guerra

God of War traz a câmera para perto do personagem. Em um estilo “câmera na mão”, o enquadramento está sempre próximo e, quando jogando, sobre os ombros de Kratos. Essa questão casa com o tipo de combate proposto aqui, além de indicar uma experiência em que o personagem é mais central; suas feições, sons, expressões e movimentos.

A exposição da história sem cortes traz um plano sequência acompanhando nosso protagonista de um ambiente para outro, e o fazendo com muita proximidade. É uma jornada crua, sem cortes ou edição no sentido de se cortar momentos. Naturalmente, ainda existe a opção do que a câmera vai nos mostrar ou não, mas a “ausência de montagem” caminha como um ponto de que é difícil esconder as coisas da audiência. Mas ainda é preciso velar uma série delas para quem joga/assiste, e também para outros personagens. Por outro lado, para pensar sobre aproximação dos jogos com cortes, edição e montagem, sugiro Thirty Flights of Loving, 13 Sentinels: Aegis Rim e Immortality.

Voltemos para a jornada de nosso deus da guerra. Uma das coisas a serem encobertas é a transição de uma área para outra. God of War, e sua sequência, são jogos de PlayStation 4, e boa parte dessa transição direta e sem cortes não poderia acontecer sem espaços estreitos e outros tipos de momentos de carregamento enquanto a ação não é interrompida por uma tela.

Tal questão é inevitável a depender do hardware, mas pessoalmente eu tendo a gostar pelo menos da expectativa causada. Aqui, é muito mais sobre um arrebate visual do que qualquer outra coisa, mas em uma experiência como Metroid Prime ou Rain World, por exemplo e por motivos diferentes, tal antecipação é poderosa.

Kratos na boca do dragão

Mas God of War também utiliza de momentos do tipo para levar o personagem de um lado ao outro. Ora, o socão do Baldur logo no começo não apenas gera um movimento bacanudo de câmera, mas também coloca o Kratos na parte de trás da casa, onde acontecerá a luta. O momento mais interessante, no entanto, vem no confronto contra o dragão.

Estamos em um ponto A, e Kratos é abocanhado pela fera; temos que agredir a criatura de dentro de sua boca, enquanto vemos apenas um pedaço pequeno do que está a fora, justamente a partir da abertura da boca do gigante ser. Ao fim, Kratos sai e estamos em um campo de batalha grande e com todos os recursos necessários para vencê-lo. Agredir e matar, aliás, são verbos muito comuns na vida do protagonista.

As cinzas

Eu não lembrava, em 2018, de detalhes mais específicos do passado de Kratos. Um destes é em relação a como o Ares, ou o Zeus, sei lá, fez com que as cinzas de sua família morta por ele ficassem grudadas em seu corpo pra sempre. Por isso ele é dessa cor e o fantasma de Esparta e tudo mais, mas eu não lembrava, me desculpem. De qualquer forma, a nova jornada do deus se coloca de forma distinta.

Nosso objetivo é, desde o início e com muitas complicações no caminho, levar as cinzas de Faye até o pico da montanha mais alta. A coisa não é tão simples assim, os deuses da região vem pra cima de Kratos e Atreus, a montanha certa fica muito mais longe do que o previsto e com isso temos uma história com conflitos e um jogo de videogame.

Constantemente Kratos olha para seus braços e as marcas das lâminas do caos. Em dado momento o personagem pode contemplar um vaso com a sua própria imagem. Kratos quer deixar para trás aqueles acontecimentos, mas as marcas estão grudadas em seu corpo. As cinzas de sua família antiga nunca o deixaram. A culpa jamais saiu.

Kratos contempla seu passado em um afresco

Junto a Atreus, Kratos chega ao local do povo de sua companheira. Ali, e após conhecerem os segredos dela, enfim jogam as suas cinzas. Esse é um ciclo completo, as coisas se foram. A culpa, em relação a ela, não ficou. Mas aquela vinda da Grécia é inescapável e ainda existe. E pode afetar como as coisas vão acontecer em relação ao Atreus e aos outros envolvidos. Saberemos em breve.

Ao fim da jornada, agora pela segunda vez, ficam as expectativas de como a trama da sequência vai lidar com os sentimentos do Kratos e com o desenvolvimento do Atreus enquanto humano, gigante e deus. Também fico no aguardo para as formas pelas quais o título irá continuar o trabalho cinematográfico de câmera na mão e em sequência, ao lado das possíveis e necessárias iterações no combate e exploração. Veremos em breve.

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Comentários

Olha... excelente texto. Esse é um problema que eu já vinha discutindo em meus círculos de amizade ha um bom tempo. Isso fica ainda mais evidente quando percebe-se a necessidade das grandes publishers de seguirem tendencias mais lucrativas não afetam apenas o game design em si, mas também as temáticas, narrativas, e até mesmo a direção de arte dos games. Vide a enxurrada de jogos de zumbis que tivemos na geração passada... Por falar em indies, eu vejo muito potencial para que os próximos AAA inovadores saiam deles. O orçamento ainda é um problema, mas financiamento coletivo já é uma realidade. Acredito que equipes extremamente competentes e comprometidas consigam levantar fundos para levar adiante o desenvolvimento de jogos desse nível.

O sorteio vai ser ao vivo via live???

Obrigado Igor! Seja bem-vindo ao Nintendo Fusion :)

Rapaz, que texto foda! Parabéns Renan! Fico cada mais feliz em ser Nintendista em tempos como esse (apesar de ainda não ter um Switch), saber que a Nintendo rema pesado contra essa maré cheia de lixo. Recentemente o designer da BioWare, Manveer Heir (Mass Effect) compartilhou que a EA só tem foco mesmo nas microtransações, que ainda viu gente gastando 15 mil dolares com cards de multiplayer do Mass Effect 3. Pra piorar agora tem o sistema de Loot Box, que está na moda, e a Warner empolgou com o Shadow of Mordor. Loot Box pra fechar campanha ou pra tentar competir online nos jogos, pra mim isso é praticamente o fim. A única esperança que tenho nessa industria que amo tanto são mesmo nos indies, Nintendo e algumas empresas. Espero que a Activision não estrague a Blizzard, pq apesar de Overwatch ter Loot Box, são completamente cosméticos, e eu acho isso bom até, pq jogar pra desbloquear coisas visuais é muito mais interessante e prazeroso que jogar pra tentar a sorte com um item específico pra ser mais competitivo com upgrades no status do personagem.

Não aparece para você no começo do texto? https://uploads.disquscdn.com/images/b809b035a7e4e21875dfe6af44cc2d10dccbe7c3eea556e1be57fe8018d72a32.png

cadê o tal formulário do Gleam? não vi link nenhum no texto... tá mal explicado isso...

Das publicadoras de games, a EA é sem duvidas a pior. Não foi atoa que foi escolhida como a pior empresa americana por dois anos consecutivos. Não quero parecer um hater, mas é essa filosofia de shooters multimilionários, com gráficos de ponta e extorquimento de dinheiro dos consumidores é que vai fazê-los fechar as portas. Isso fica evidente com o “apoio” da empresa ao Switch, não souberam mais uma vez ler o sucesso do console, e repetem os mesmos erros de uma década: investir pesado em gêneros supersaturados. E é interessante notar como o Iwata foi capaz de enxergar uma realidade mais de uma década á sua frente, e feliz que cada vez mais empresas adotam essa estratégia: jogos de menor orçamento e maior foco no público

Agora sim vou ter meu switch o/

Sim!

Qual é a exceção "imperdoável"? Chrono Trigger?

Reativei minha conta só pra promoção kkkk

Cara, não uso Twitter. Até tenho, mas nem lembro senha nem nada. Vamos ver se tenho sorte

Parabéns à todos nessa nova empreitada, o site é promissor!

Acho que o único defeito desse game foi ter requentado muitas fases, poderia ter sido apenas a GHZ, por exemplo. Mas fora isso é impecável.

sera que agora ganho o

Precisa compartilhar no Facebook. Nos outros lugares é opcional.

Eu preciso compartilhar o sorteio pelo facebook? Ou é preciso compartilhar em outro lugar?

Felipe Sagrado escreva-se em tudo para aumenta a change brother!!!!

Você pode participar sim, só não vai poder obter os dois cupons relacionados ao Twitter. :)

Boa tarde. Eu não uso o Twitter, então gostaria de saber se isso impede minha participação ou só diminui minhas chances?

? vou seguir o Renan aqui tbm