Quando No More Heroes lançou no Japão, em 2007, o diretor e criador do jogo Suda 51 estava lá para assinar cópias e entregá-las com o bônus de pré-venda: papel higiênico. Vinte minutos depois, ninguém tinha comprado o jogo e, com pena, um jornalista comprou uma cópia do jogo. Essa pequena história diz muito sobre o que No More Heroes foi em sua produção e eventualmente se tornou: um projeto de coragem sobre lutar por uma visão, mas que não teria o sucesso que se esperava.
Suda51 se tornou um produtor conhecido nos últimos anos. Do polêmico Killer is Dead ao famoso Lollipop Chainsaw, o designer até estreou uma colaboração com Shinji Mikami, a cabeça por trás de jogos como Resident Evil e Resident Evil 4, em Shadows of the Damned. Mas nada disso teria acontecido se não tivesse sido diretor e criador de diversos jogos antes (principalmente No More Heroes, um clássico cult para o Nintendo Wii). Nesse texto vamos revisitar a obra original e comentar por cima a versão remasterizada recém-chegada ao Nintendo Switch.
No More Heroes foi um projeto pessoal do diretor, que queria mostrar que conseguia fazer humor depois de tantos jogos sérios (como The Silver Case). Além disso, Suda teve que lutar contra a Marvelous, que publicou o jogo originalmente, para manter o projeto no Wii, já que queria usar o controle e suas tecnologias de movimento enquanto a empresa queria capitalizar no console da Microsoft. Depois de muitas discussões, o projeto se manteve no Wii e foi construído inteiramente em torno dos controles de movimento do Wii, mesmo com a audiência casual do console.
No More Heroes conta a história de Travis Touchdown, um otaku lutador de wrestling que, para impressionar uma garota que conheceu num bar, Sylvia, aceita uma missão de assassinar um homem. Isso escala absurdamente e Travis se vê num jogo que deve matar todos os assassinos acima de seu ranking para ser o número um e, quem sabe, garantir pelo menos um beijo de Sylvia, que está por trás de toda essa operação. É uma história absurda, mas simples, que corta excessos para focar em você, jogador, se divertindo no mundo e nas missões. Apesar disso, há diversos momentos que te deixam emocionado e pensativo.
Cada um dos assassinos, apesar de poucas falas, é construído visualmente e com conversas que vão direto ao ponto. Com cutscenes curtíssimas, a escrita precisava ser cirurgicamente pensada, e foi exatamente o que fizeram. A cena que mais me chamou atenção foi a de Holly Summers, ranking 6, que levanta a moralidade de tudo que eles estavam fazendo. Seria Travis tão diferente de seus adversários? O jogo nunca entra a fundo nessas questões, seja por uma questão de dinheiro para construir essas cenas ou por uma direção absolutamente focada no projeto de jogo que No More Heroes apresenta, mas os elementos estão lá para serem pensados e debatidos. É o que me surpreendeu quando joguei no Wii e continua me surpreendendo quando o fiz novamente, agora no Switch.
O jogo se estrutura em um mundo aberto que é claramente uma paródia de jogos de mundo aberto tidos até então, como os títulos Grand Theft Auto de PS2. É uma imensidão artificial na qual você pode atropelar pessoas, comprar novas roupas para Travis e encontrar os pontos de progresso da história. O problema de paródias, especialmente em jogos, é que existe uma linha tênue entre a paródia que faz a piada e subverte as expectativas (“perfeita”) e a paródia que acaba repetindo os erros das coisas que está se fazendo piada, que acaba sendo o caso de No More Heroes. Por mais que seja hilário por muito tempo esse mundo absurdamente grande sem nada, navegar acaba sendo cansativo durante as horas finais.
No mundo, os pontos aos quais você repetidamente retorna são a academia para melhorar suas habilidades, a agência de bicos para você ganhar o dinheiro necessário para enfrentar o próximo ranking e a agência de assassinatos, com o mesmo objetivo. Todos esses pontos de interesse ficam bastante próximos e o resto do imenso mapa é preenchido com colecionáveis para desbloquear habilidades. O mapa é tão imenso que, no remaster de PS3, o jogo descartou parte do mapa que não tinha nenhum ponto de interesse provavelmente para não perder dinheiro trabalhando em uma área inutilizada.
Mesmo com a linha entre paródia e reprodução cruzada, o humor desse mundo não para um segundo de te fazer rir. Quando recebi uma missão que justificava não poder usar moto por ser uma “missão ecologicamente correta”, não consegui conter a risada. É um jogo que não para de fazer piadas, mesmo tratando de problemas sérios (que Suda51 personifica em cada um dos assassinos, como Shinobi sendo a adolescência japonesa debilitada e com tendências violentas e suicidas). Esses comentários, entretanto, podem não descer bem para todos. Treze anos se passaram e há coisas que não são mais tão bem aceitas, então será interessante pensar como No More Heroes III poderá tratar seu humor no futuro.
Quanto ao combate, originalmente o jogo só permitia jogar com controles de movimento, o que ele mesmo parece saber que é um pouco inesperado e engraçado de se fazer. A animação de carregamento do sabre-de-luz fazia uma referência a um ato obsceno, mas na versão do Switch há a possibilidade de jogar com controles tradicionais, algo que só foi introduzido em sua sequência, Desperate Struggle. Ambas opções funcionam bem, mas, pela natureza de muitos inputs ao mesmo tempo, com finalizadores que exigem precisão de movimento, eu preferi continuar com controles tradicionais. Nos finalizadores, os Joy-Cons não funcionavam tão bem quanto no resto do jogo. Porém, o jogo é balanceado a partir de controles de movimento, então é importante pensar que se torna consideravelmente mais fácil com controles tradicionais.
Sobre o remaster para Switch, é a primeira vez que o jogo roda majoritariamente em 60 quadros por segundo, o que deixa a experiência definitiva junto à resolução Full HD. Tudo isso com a direção de arte original que fez a série tão amada, diferente do remaster de PS3. Sempre pensei que, caso relançassem o jogo, seria essa versão, mas fiquei contente quando notei que era a original de Wii. O cel shading deixa os visuais únicos e ajuda a desmascarar as limitações de hardware, principalmente no mundo aberto.
No More Heroes é uma trajetória de Travis para o que ele achava que era apenas uma possível transa, mas que acaba sendo uma reflexão sobre o que somos e como lidamos com os diversos problemas que nos cercam. Nesse mundo sem heróis, a moralidade vira algo incerto: o certo e o errado são contestáveis, e Travis precisa se encontrar no meio disso. Mesmo com um mundo que fica cansativo, a escrita de pouquíssimas palavras tem um humor pontual ótimo e as missões são únicas e com lutas contra chefes que você não encontrará em nenhum outro jogo. Com o preço reduzido na eShop, não há motivos para perder esse clássico. É um jogo que não sai da minha cabeça e que, com certeza, vai continuar por muito tempo.
Comentários
Olha... excelente texto. Esse é um problema que eu já vinha discutindo em meus círculos de amizade ha um bom tempo. Isso fica ainda mais evidente quando percebe-se a necessidade das grandes publishers de seguirem tendencias mais lucrativas não afetam apenas o game design em si, mas também as temáticas, narrativas, e até mesmo a direção de arte dos games. Vide a enxurrada de jogos de zumbis que tivemos na geração passada... Por falar em indies, eu vejo muito potencial para que os próximos AAA inovadores saiam deles. O orçamento ainda é um problema, mas financiamento coletivo já é uma realidade. Acredito que equipes extremamente competentes e comprometidas consigam levantar fundos para levar adiante o desenvolvimento de jogos desse nível.
O sorteio vai ser ao vivo via live???
Obrigado Igor! Seja bem-vindo ao Nintendo Fusion :)
Rapaz, que texto foda! Parabéns Renan! Fico cada mais feliz em ser Nintendista em tempos como esse (apesar de ainda não ter um Switch), saber que a Nintendo rema pesado contra essa maré cheia de lixo. Recentemente o designer da BioWare, Manveer Heir (Mass Effect) compartilhou que a EA só tem foco mesmo nas microtransações, que ainda viu gente gastando 15 mil dolares com cards de multiplayer do Mass Effect 3. Pra piorar agora tem o sistema de Loot Box, que está na moda, e a Warner empolgou com o Shadow of Mordor. Loot Box pra fechar campanha ou pra tentar competir online nos jogos, pra mim isso é praticamente o fim. A única esperança que tenho nessa industria que amo tanto são mesmo nos indies, Nintendo e algumas empresas. Espero que a Activision não estrague a Blizzard, pq apesar de Overwatch ter Loot Box, são completamente cosméticos, e eu acho isso bom até, pq jogar pra desbloquear coisas visuais é muito mais interessante e prazeroso que jogar pra tentar a sorte com um item específico pra ser mais competitivo com upgrades no status do personagem.
Não aparece para você no começo do texto? https://uploads.disquscdn.com/images/b809b035a7e4e21875dfe6af44cc2d10dccbe7c3eea556e1be57fe8018d72a32.png
cadê o tal formulário do Gleam? não vi link nenhum no texto... tá mal explicado isso...
Das publicadoras de games, a EA é sem duvidas a pior. Não foi atoa que foi escolhida como a pior empresa americana por dois anos consecutivos. Não quero parecer um hater, mas é essa filosofia de shooters multimilionários, com gráficos de ponta e extorquimento de dinheiro dos consumidores é que vai fazê-los fechar as portas. Isso fica evidente com o “apoio” da empresa ao Switch, não souberam mais uma vez ler o sucesso do console, e repetem os mesmos erros de uma década: investir pesado em gêneros supersaturados. E é interessante notar como o Iwata foi capaz de enxergar uma realidade mais de uma década á sua frente, e feliz que cada vez mais empresas adotam essa estratégia: jogos de menor orçamento e maior foco no público
Agora sim vou ter meu switch o/
Sim!
Qual é a exceção "imperdoável"? Chrono Trigger?
Reativei minha conta só pra promoção kkkk
Cara, não uso Twitter. Até tenho, mas nem lembro senha nem nada. Vamos ver se tenho sorte
Parabéns à todos nessa nova empreitada, o site é promissor!
Acho que o único defeito desse game foi ter requentado muitas fases, poderia ter sido apenas a GHZ, por exemplo. Mas fora isso é impecável.
sera que agora ganho o
Precisa compartilhar no Facebook. Nos outros lugares é opcional.
Eu preciso compartilhar o sorteio pelo facebook? Ou é preciso compartilhar em outro lugar?
Felipe Sagrado escreva-se em tudo para aumenta a change brother!!!!
Você pode participar sim, só não vai poder obter os dois cupons relacionados ao Twitter. :)
Boa tarde. Eu não uso o Twitter, então gostaria de saber se isso impede minha participação ou só diminui minhas chances?
? vou seguir o Renan aqui tbm