O terceiro episódio de The Last of Us é um daqueles casos de “quanto mais penso a respeito, mais eu gosto”. Muito disso se deve especialmente a como os produtores do seriado optaram por mudar os eventos que rolam em comparação com o jogo, adaptando-os de forma interessante e inteligente para outra mídia – afinal, muito do que foi exposto aqui dificilmente funcionaria no game. As palavras do próprio Neil Druckmann deixam claro: “Minha filosofia com este programa sempre foi ‘quando devemos nos afastar e quando devemos voltar?’. Se for meio que o mesmo ou pior, nós mantemos como é no jogo; se for melhor, nós alteramos”.
Diferentemente dos dois primeiros episódios, “Long Long Time” não abre com uma história anterior à pandemia, mas sim direto com Joel (Pedro Pascal) e Ellie (Bella Ramsey) seguindo o caminho até a cidade de Lincoln, onde Joel pretende pedir ajuda a um velho amigo, Bill (Nick Offerman). Há uma breve exposição da relação entre Joel e Ellie, com a garota tagarelando e irritando o velho contrabandista, enquanto este permanece monossilábico e metódico. Nesse sentido, quem jogou o game até identificará pequenos detalhes, como a garota se empolgando com uma máquina de fliperama de Mortal Kombat II (que é um diálogo opcional no jogo e o fliperama é obviamente fictício), mas as similaridades acabam aqui.
Após um breve papo a respeito de como a pandemia pode ter se originado – onde Joel explica a teoria de que o fungo provavelmente sofreu mutação e, como era presente na farinha ou em grãos, matérias-primas de inúmeros alimentos, contaminou as pessoas em escala global ao mesmo tempo – a dupla para em frente a um buraco cheio de esqueletos, marca dos primeiros dias da pandemia, quando as pessoas eram simplesmente assassinadas pela FEDRA devido à falta de espaço nos abrigos do governo – os mortos, afinal, não podem se infectar pelo fungo. Daí, temos o corte temporal do episódio, indo para 30 de setembro de 2003, quando toda a cidade de Lincoln é evacuada, exceto por um habitante, Bill.
No The Last of Us original, Bill é um sujeito neurótico, porém extremamente engenhoso, tendo tomado a cidade toda para si, a enchendo de armadilhas e alarmes para evitar que os infectados a invadissem. Ele ajuda Joel a conseguir uma bateria para um carro, quitando uma dívida que tinha com ele, além de também bater boca com Ellie em algumas passagens divertidíssimas. Em resumo, todo o arco do personagem permanece no presente, com poucos detalhes mais profundos sendo revelados de forma sutil, em especial sobre seu relacionamento com Frank (Murray Bartlett) e sua sexualidade. Já no seriado, Bill continua neurótico, engenhoso e dono da cidade, mas seu relacionamento com Frank é bem mais explorado, tomando foco central do episódio.
Uma das coisas mais bacanas dessa escolha é que nós nunca vemos Frank vivo no jogo – apenas encontramos seu corpo, após tirar a própria vida – enquanto o seriado procura mostrar não só como Bill o conheceu (em 2007, ou seja, após quatro anos sem contato humano) e como o relacionamento dos dois se desenvolveu.
Frank é o total oposto de Bill. Enquanto este é um cara que está constantemente pilhado e preocupado com a segurança, desconfiando de todos e sem medo de meter chumbo nos desavisados, Frank é um cara muito mais aberto e resolvido, que serve de equilíbrio na relação dos dois. É Frank, inclusive, que começa a colocar na cabeça de Bill a ideia de passarem a ter alguns poucos amigos, gente em quem podem confiar – e aí entram Joel e Triss (Anna Torv), aparecendo mais novos em uma cena onde almoçam com o casal e trocam informações.
A forma como Frank dá um novo propósito a Bill passa uma mensagem muito bonita sobre como podemos tirar força em frente às maiores adversidades da vida. E isso carrega muito o DNA de toda a franquia The Last of Us: é sobre resistir e sobreviver (endure and survive) da forma que der nesse mundo hostil, mas também – e principalmente – sobre amor.
É até curioso parar para pensar no quão privilegiados Bill e Frank foram durante as duas décadas até os dias atuais. Eles criaram uma vida juntos, vida essa que, mesmo ainda enfrentando dias ruins, invasões de saqueadores e infectados, era verdadeiramente uma vida que valia ser vivida, especialmente por terem um ao outro. E nesse sentido, o impacto da decisão final tanto de Frank quanto de Bill dão um tom poético e ainda mais lindo à jornada de ambos – e justificam a mudança em relação ao jogo. Enquanto nós nunca mais sabemos de Bill no TLoU original, na série nós temos a certeza de que ele e seu companheiro tiveram o fim que mereciam – e eu não duvido que fariam tudo novamente, se tivessem a chance.
Ao fim da história de Bill e Frank, vemos Joel e Ellie chegando até a casa onde os amigos viviam, mas sendo surpreendidos por não os encontrarem lá (seus corpos ficam no quarto, que permanece trancado). Ali, a dupla reúne recursos e preparam uma bateria para um carro, podendo finalmente seguir viagem em busca do irmão de Joel. Mas isso acontece não antes de Ellie encontrar uma carta de Bill endereçada a Joel (no jogo também há uma carta, mas do falecido Frank endereçada ao Bill), onde o velho amigo dá permissão para que o sobrevivente leve todas as armas e equipamentos que precisasse e reforça a importância de proteger e salvar aqueles que puder salvar, citando em particular a Tess. O paralelo é impossível de passar despercebido. Joel falhou duas vezes até agora. Falhou em proteger Sarah e falhou em proteger Tess. Até quando isso acontecerá?
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Long Long Time é um episódio extremamente bem-sucedido. Ele utiliza inteligentemente o fato de ser uma adaptação para seriado, dando o devido palco à história de Bill e Frank de forma que jamais seria possível no jogo e isso funciona surpreendentemente bem. A intenção, no fim das contas, é justamente expandir esse universo que conhecemos tão bem, sem ser uma mera cópia de um pra um (coisa que, honestamente, teria um resultado péssimo), sem deixar de envolver quem está conhecendo a franquia pela primeira vez.
Embora não seja um episódio perfeito – algumas falas não encaixam perfeitamente, o relacionamento de Bill e Frank talvez pudesse levar um pouco mais de tempo para realmente começar a engrenar – o resultado final é sem dúvidas acima da média. É um episódio triunfal que carrega de forma honesta o DNA da franquia e tem um peso emocional ímpar e memorável.
Comentários
Olha... excelente texto. Esse é um problema que eu já vinha discutindo em meus círculos de amizade ha um bom tempo. Isso fica ainda mais evidente quando percebe-se a necessidade das grandes publishers de seguirem tendencias mais lucrativas não afetam apenas o game design em si, mas também as temáticas, narrativas, e até mesmo a direção de arte dos games. Vide a enxurrada de jogos de zumbis que tivemos na geração passada... Por falar em indies, eu vejo muito potencial para que os próximos AAA inovadores saiam deles. O orçamento ainda é um problema, mas financiamento coletivo já é uma realidade. Acredito que equipes extremamente competentes e comprometidas consigam levantar fundos para levar adiante o desenvolvimento de jogos desse nível.
O sorteio vai ser ao vivo via live???
Obrigado Igor! Seja bem-vindo ao Nintendo Fusion :)
Rapaz, que texto foda! Parabéns Renan! Fico cada mais feliz em ser Nintendista em tempos como esse (apesar de ainda não ter um Switch), saber que a Nintendo rema pesado contra essa maré cheia de lixo. Recentemente o designer da BioWare, Manveer Heir (Mass Effect) compartilhou que a EA só tem foco mesmo nas microtransações, que ainda viu gente gastando 15 mil dolares com cards de multiplayer do Mass Effect 3. Pra piorar agora tem o sistema de Loot Box, que está na moda, e a Warner empolgou com o Shadow of Mordor. Loot Box pra fechar campanha ou pra tentar competir online nos jogos, pra mim isso é praticamente o fim. A única esperança que tenho nessa industria que amo tanto são mesmo nos indies, Nintendo e algumas empresas. Espero que a Activision não estrague a Blizzard, pq apesar de Overwatch ter Loot Box, são completamente cosméticos, e eu acho isso bom até, pq jogar pra desbloquear coisas visuais é muito mais interessante e prazeroso que jogar pra tentar a sorte com um item específico pra ser mais competitivo com upgrades no status do personagem.
Não aparece para você no começo do texto? https://uploads.disquscdn.com/images/b809b035a7e4e21875dfe6af44cc2d10dccbe7c3eea556e1be57fe8018d72a32.png
cadê o tal formulário do Gleam? não vi link nenhum no texto... tá mal explicado isso...
Das publicadoras de games, a EA é sem duvidas a pior. Não foi atoa que foi escolhida como a pior empresa americana por dois anos consecutivos. Não quero parecer um hater, mas é essa filosofia de shooters multimilionários, com gráficos de ponta e extorquimento de dinheiro dos consumidores é que vai fazê-los fechar as portas. Isso fica evidente com o “apoio” da empresa ao Switch, não souberam mais uma vez ler o sucesso do console, e repetem os mesmos erros de uma década: investir pesado em gêneros supersaturados. E é interessante notar como o Iwata foi capaz de enxergar uma realidade mais de uma década á sua frente, e feliz que cada vez mais empresas adotam essa estratégia: jogos de menor orçamento e maior foco no público
Agora sim vou ter meu switch o/
Sim!
Qual é a exceção "imperdoável"? Chrono Trigger?
Reativei minha conta só pra promoção kkkk
Cara, não uso Twitter. Até tenho, mas nem lembro senha nem nada. Vamos ver se tenho sorte
Parabéns à todos nessa nova empreitada, o site é promissor!
Acho que o único defeito desse game foi ter requentado muitas fases, poderia ter sido apenas a GHZ, por exemplo. Mas fora isso é impecável.
sera que agora ganho o
Precisa compartilhar no Facebook. Nos outros lugares é opcional.
Eu preciso compartilhar o sorteio pelo facebook? Ou é preciso compartilhar em outro lugar?
Felipe Sagrado escreva-se em tudo para aumenta a change brother!!!!
Você pode participar sim, só não vai poder obter os dois cupons relacionados ao Twitter. :)
Boa tarde. Eu não uso o Twitter, então gostaria de saber se isso impede minha participação ou só diminui minhas chances?
? vou seguir o Renan aqui tbm