Se o título anterior tinha lá suas experimentações, existindo em uma realidade para além da concepção lógica do “bom design”, Final Fantasy III se ancorou um tanto mais no original de 1987 e expandiu a jogabilidade presente ali. O terceiro videogame da série é uma obra de extrema competência em termos de proposta de jogo. É, também, uma conquista visual surpreendente. Seu único pecado não é nem mesmo seu: ficou à sombra, com o tempo, de um irmão dois anos mais novo.
Temos aqui uma espécie de reedição do conto do primeiro jogo: quatro guerreiros da luz devem proteger os cristais e enfrentar aqueles que pretendem trazer escuridão ao mundo. Na versão original de FF III, os quatro heróis não possuíam nome. Entretanto, ficaram registrados oficialmente como Luneth, Arc, Refia e Ingus a partir do remake de Nintendo DS.
Ao contrário do primeiro título, no qual escolhemos as classes dos guerreiros na primeira tela e devemos seguir com elas ao longo de toda campanha — apenas alterando para as respectivas formas avançadas —, começamos Final Fantasy III com os personagens na profissão freelancer, podendo mudar para outros jobs ao longo da aventura. Cada encontro com um cristal abre a possibilidade de acessar mais profissões, sendo possível alterar a qualquer momento.
Essa característica se entrelaça com um determinado aspecto narrativo do título, fazendo com que o jogo se dê por “episódios”. Comentarei mais adiante, mas tomo a liberdade de antecipar minha carteira oficial de tiozinho em alguns anos e afirmar o seguinte: Final Fantasy III não é apenas episódico, é sobretudo “epijóbico”.
Do ponto de vista do sistema de profissões, a proposta deste terceiro jogo é justamente dar liberdade ao jogador para trocar, descobrir, experimentar e escolher a formação ideal em cada desafio que vai surgindo. Dessa forma, é comum identificar uma melhor combinação para uma dungeon ou chefe em específico.
Temos, então, um determinado time dentro das batalhas. O sistema de confrontos de Final Fantasy III permanece o mesmo dos anteriores: escolhemos as ações de cada personagem no início do turno e vemos então os indivíduos envolvidos na batalha agir em ordem determinada pela velocidade de cada um. Existe, porém, uma diferença importante em relação ao menu de batalha.
Os dois jogos anteriores traziam o mesmo grupo de opções para cada personagem: atacar, usar magia, usar item, fugir. O primeiro, é verdade, ainda possuía a opção “beber” específica para poções. De qualquer forma, a novidade em FF 3 é trazer os comandos específicos de cada profissão: o ladrão pode roubar, o dragoon pular, e por aí vai.
Os chefes, além de possuírem consideráveis quantias de HP, costumam possibilitar resoluções distintas ao enfrentarmos. Temos, então, uma jogabilidade que propõe definirmos estratégias e preparar a equipe e habilidades certas antes dos grandes confrontos.
Em termos de progressão das personagens, a coisa é similar ao do primeiro título, porém conta com um fator adicional. Como em Final Fantasy, nossos heróis evoluem através de experiência o seu nível geral. De forma inédita, evoluem também cada profissão em específico para cada personagem. Existem dois níveis: o original do personagem e o daquele guerreiro naquele determinado job.
A partir disso desenvolve-se um ritmo bem legal de acessar novas profissões e pensar o melhor time para os desafios. O jogador pode, se quiser, escolher apenas uma profissão para cada personagem e focar nelas, mas a ideia do título é propor a adequação e o uso variado.
Essa relação com as classes e seus comandos é extrapolada para a forma como avançamos nos calabouços e interagimos com o mundo. Um ladrão pode abrir portas fechadas em uma dungeon, na ausência de um na equipe deve-se recorrer a um item em específico ou esquecer aquela passagem.
As magias Toad e Mini são essenciais nesse sentido. Em batalha, são debuffs que fazem o alvo virar um sapo ou diminuir muito de tamanho: o primeiro status impossibilita magias, e o segundo faz os golpes físicos serem fraquíssimos. Na exploração podemos acessar lugares importantes para prosseguir a campanha ao utilizarmos as magias citadas. Naturalmente só as podemos usar como habilidade de algum personagem nas profissões mágicas. Magias e equipamentos, aliás, seguem a mesma toada dos antecessores: é preciso encontrar ou comprar itens e tomos par usá-las.
Outra novidade é a chegada das invocações. Bahamut e Leviathan já vinham fazendo parte das tramas, mas esta é a primeira vez que temos a possibilidade de usar esses seres místicos nas batalhas. Algumas das summons são conseguidas em lojas, mas há aquelas encontradas apenas a partir de exploração e de cumprir objetivos extra.
Final Fantasy III traz um mapa geral menos confuso em relação ao seu antecessor — não que isso seja difícil — e inaugura uma tendência de trazer mais de um mapa mundial navegável que rolou até o sexto título da série. Neste, começamos em uma porção do mundo depois revelado ser apenas uma parte alçada aos céus. O restante abre-se após determinado ponto da campanha.
Outro aspecto importante de destacar é como o jogo segmenta a movimentação pelo mundo a partir de seus veículos. Essa relação existia nos anteriores, mas aqui ganha uma centralidade na forma como o jogo restringe e depois autoriza a exploração, segmentando os locais passíveis de serem visitados em cada momento da jornada.
Se em termos de jogabilidade e apresentação visual Final Fantasy III é a realização do título original de 1987, em termos de enredo ele também vai no sentido de reeditar aquela clássica história dos heróis da luz protegendo o cristal e, consequentemente, o mundo.
Existe uma ameaça ao equilíbrio do mundo tal qual no primeiro e os cristais possuem uma presença central. A ameaça, entretanto, é de uma natureza diferente da do primeiro. Comentarei após o aviso de spoilers, mas antes gostaria de falar um punhadinho da estrutura do enredo de Final Fantasy III.
Os objetivos gerais da jornada são relativamente simples, mas acessá-los geralmente se dá através da resolução de contratempos. Tais problemas acontecem através de alguns arcos menores em cidades visitadas ao longo da jornada.
Os próximos parágrafos contém spoilers.
Se em um lugar um gênio fez as pessoas sumirem, em outro encontramos um jovem desmemoriado. Um dos mais interessante desses capítulos se dá no reino de Saronia. Imponente do ponto de vista visual, temos pela primeira vez uma cidade ocupando boa parte do mapa:
Entramos em contato com tal arco a partir do acesso à caravela voadora — através dos engenhos do Cid. Ao se aproximarem do castelo, os heróis são abatidos e a nave cai. Lá dentro, descobrem que o Rei resolveu dividir o país em dois e fazer os dois exércitos se enfrentarem.
Aqui, como no resto desses pequenos arcos, o problema está em algum monstro agindo a partir do grande poder do mago Xande, nosso antagonista e um dos três aprendizes do feiticeiro Noah – os outros dois nos ajudam na jornada. O homem recebe de seu mestre o dom da mortalidade enquanto seus companheiros recebem presentes mágicos menos curiosos como sabedoria infinita ou o controle do reino dos sonhos. Xande, passando a temer a morte resolveu para o tempo.
Por conta disso parte do mundo vai ao céus, e a outra porção permanece congelada até a chegada dos quatro guerreiros da luz. Após fazer o fluxo temporal descongelar, resta enfrentar Xande e impedir seu plano de cessar o passar do tempo. Porém, o inimigo toma o poder dos cristais e cria um grande desequilíbrio, revelando o verdadeiro inimigo do jogo: a escuridão encarnada.
A derradeira batalha acontece ao som de uma das primeiras grandes músicas de chefes da franquia. Após seu fim o mundo encontra equilíbrio. Ao meu ver, a parte mais curiosa e interessante dessa trama é pensar nos presentes de Noah aos seus discípulos.
Temos três presentes: conhecimento, controle do mundo dos sonhos e mortalidade. Vistos assim, o último de fato parece “de grego”. De um outro ponto de vista, porém, são partes da experiência humana. O conhecimento está atrelado à consciência, o sonho ao inconsciente, e a mortalidade relaciona-se com a não consciência. São, de certa forma, os três possíveis estados do cérebro.
Noah, cujo nome é relacionado ao bíblico Noé, está propondo uma espécie de fim aos que deram errado, para então proceder com um recomeço? Xande representaria uma falha? Sobre isso, pode-se apenas especular. Noah é brevemente citado, e mesmo Xande não gasta lá muitas linhas de diálogo.
Final Fantasy III é, em muita medida, uma realização do primeiro. O comentário metalinguística ainda existe, dado que o tempo no mundo pós-prólogo só move com os guerreiros da luz, mas deixa o centro da estória. Enquanto o antecessor experimentou e, do ponto de vista das profissões, inaugurou uma tendência que só retornaria com Final Fantasy VI, o terceiro título levou adiante a proposta inaugurada em 1987.
Este é o terceiro texto de uma longa série de publicações sobre a franquia. Retornaremos, em breve, com um dos favoritos dos fãs: Final Fantasy IV.
Comentários
Olha... excelente texto. Esse é um problema que eu já vinha discutindo em meus círculos de amizade ha um bom tempo. Isso fica ainda mais evidente quando percebe-se a necessidade das grandes publishers de seguirem tendencias mais lucrativas não afetam apenas o game design em si, mas também as temáticas, narrativas, e até mesmo a direção de arte dos games. Vide a enxurrada de jogos de zumbis que tivemos na geração passada... Por falar em indies, eu vejo muito potencial para que os próximos AAA inovadores saiam deles. O orçamento ainda é um problema, mas financiamento coletivo já é uma realidade. Acredito que equipes extremamente competentes e comprometidas consigam levantar fundos para levar adiante o desenvolvimento de jogos desse nível.
O sorteio vai ser ao vivo via live???
Obrigado Igor! Seja bem-vindo ao Nintendo Fusion :)
Rapaz, que texto foda! Parabéns Renan! Fico cada mais feliz em ser Nintendista em tempos como esse (apesar de ainda não ter um Switch), saber que a Nintendo rema pesado contra essa maré cheia de lixo. Recentemente o designer da BioWare, Manveer Heir (Mass Effect) compartilhou que a EA só tem foco mesmo nas microtransações, que ainda viu gente gastando 15 mil dolares com cards de multiplayer do Mass Effect 3. Pra piorar agora tem o sistema de Loot Box, que está na moda, e a Warner empolgou com o Shadow of Mordor. Loot Box pra fechar campanha ou pra tentar competir online nos jogos, pra mim isso é praticamente o fim. A única esperança que tenho nessa industria que amo tanto são mesmo nos indies, Nintendo e algumas empresas. Espero que a Activision não estrague a Blizzard, pq apesar de Overwatch ter Loot Box, são completamente cosméticos, e eu acho isso bom até, pq jogar pra desbloquear coisas visuais é muito mais interessante e prazeroso que jogar pra tentar a sorte com um item específico pra ser mais competitivo com upgrades no status do personagem.
Não aparece para você no começo do texto? https://uploads.disquscdn.com/images/b809b035a7e4e21875dfe6af44cc2d10dccbe7c3eea556e1be57fe8018d72a32.png
cadê o tal formulário do Gleam? não vi link nenhum no texto... tá mal explicado isso...
Das publicadoras de games, a EA é sem duvidas a pior. Não foi atoa que foi escolhida como a pior empresa americana por dois anos consecutivos. Não quero parecer um hater, mas é essa filosofia de shooters multimilionários, com gráficos de ponta e extorquimento de dinheiro dos consumidores é que vai fazê-los fechar as portas. Isso fica evidente com o “apoio” da empresa ao Switch, não souberam mais uma vez ler o sucesso do console, e repetem os mesmos erros de uma década: investir pesado em gêneros supersaturados. E é interessante notar como o Iwata foi capaz de enxergar uma realidade mais de uma década á sua frente, e feliz que cada vez mais empresas adotam essa estratégia: jogos de menor orçamento e maior foco no público
Agora sim vou ter meu switch o/
Sim!
Qual é a exceção "imperdoável"? Chrono Trigger?
Reativei minha conta só pra promoção kkkk
Cara, não uso Twitter. Até tenho, mas nem lembro senha nem nada. Vamos ver se tenho sorte
Parabéns à todos nessa nova empreitada, o site é promissor!
Acho que o único defeito desse game foi ter requentado muitas fases, poderia ter sido apenas a GHZ, por exemplo. Mas fora isso é impecável.
sera que agora ganho o
Precisa compartilhar no Facebook. Nos outros lugares é opcional.
Eu preciso compartilhar o sorteio pelo facebook? Ou é preciso compartilhar em outro lugar?
Felipe Sagrado escreva-se em tudo para aumenta a change brother!!!!
Você pode participar sim, só não vai poder obter os dois cupons relacionados ao Twitter. :)
Boa tarde. Eu não uso o Twitter, então gostaria de saber se isso impede minha participação ou só diminui minhas chances?
? vou seguir o Renan aqui tbm