Retrô: Jogos Indies e a Era de Ouro dos Arcades - Neo Fusion
Retrô
Jogos Indies e a Era de Ouro dos Arcades
26 de julho de 2023

Já ouviu falar de Pac-Man? Sabe, um dos jogos mais influentes e reconhecíveis da mundo dos vídeo-jogos? Criado originalmente em Maio de 1980, há mais de 40 anos, o icônico “come-come”, como ficou conhecido aqui no Brasil, conquistou milhares de fãs e conseguiu manter a sua relevância – de um jeito ou de outro – até os dias atuais, com Pac-Man World Re-Pac e Pac-Man Museum + lançados em 2022, esse último sendo uma coletânea moderna das origens do protagonista amarelado. Um retorno ao passado, e uma reflexão de como eram os jogos no início da sua popularidade, e não é a única vez que esses jogos antigos são preservados (e ainda bem por isso).

Algumas coletâneas como Namco Museum, Capcom Arcade Stadium ou o acervo inacabável de Arcade Archives em consoles como PS4 ou Switch trazem versões convenientes desses jogos clássicos no conforto da sua casa, e como sempre a cena de jogos independentes traz novos inspirados pelos clássicos de outrora que, muitas vezes, conseguem desprovar o velho e cansado argumento “não existem jogos como antigamente”: você provavelmente só está olhando no lugar errado. Os casos de estudo de hoje – Annalynn, Donut Dodo e Murtop – cabem exatamente nessa última fala, mas vamos um passo de cada vez: para falar do futuro, vamos antes relembrar o passado. Se acomode, esse vai ser um texto bem longo.

A GÊNESE DOS ARCADES E POR QUE FIZERAM TANTO SUCESSO

O ano é 1978, e um curioso jogo chamado Space Invaders é lançado e começa a conquistar o público japonês, a ponto de engolir tantos ienes (nome da moeda japonesa) que novas moedas tiveram que ser produzidas em massa e muitas lojas começaram a investir cada vez mais nas máquinas milagrosas, que atraíam clientes de todas as idades. O visual tão simples e que parecia tão vivo cativava os olhares – algo que, ao olhar de uma terceira pessoa, parecia tão fácil, e instigava a competição entre os jogadores e para cada um separadamente, a ideia de se superar e conseguir mostrar para o mundo que você tinha chegado até ali, a sua pontuação e escore tinha sido a maior!

Parecia coisa do futuro, e, de um jeito ou de outro, acabou realmente se tornando isso: Space Invaders influenciou centenas de jogos de fliperama, e depois de 40 anos, os videogames estão mais populares do que nunca. Tudo isso com um jogo de uma simples tela, alienígenas se mexendo com dois frames de animação, um botão e, acima de tudo, um design viciante que era fácil de aprender e difícil de dominar.

E a fórmula continuou a ser refinada – Esse aqui é Space Invaders Extreme, e fica a minha recomendação se você quiser uma versão ainda mais viciante e psicodélica do clássico!

Passados alguns anos, em 1980, surgiu o famoso e anteriormente mencionado Pac-Man, e nesse ponto as portas foram escancaradas para a mania que os arcades estavam trazendo. Foi por conta de Pac-Man que certas empresas fariam suas grandes entradas na indústria, como a Konami com Frogger em 1981, a Nintendo com Donkey Kong também em 1981, ou a Capcom em 1984 com Vulgus e 1942 (esse é o nome do jogo, não o ano que fez sucesso). Tudo isso com um jogo que só possuía um joystick, uma tela que se repetia pra cada fase e algumas telas de transição, mas não se engane: o sucesso desses jogos e de muitos outros dessa época está nos seus pequenos detalhes.

Usemos mais uma vez Pac-Man de exemplo principal, já que não só é um dos mais famosos mas é um dos meus preferidos. Se, por algum acaso do destino, você nunca jogou Pac-Man, esse é o básico do jogo: controlamos nosso querido come-come em um labirinto usando quatro direções enquanto este come todas as pílulas espalhadas pelo cenário e foge de fantasmas. Se eles te pegarem, você perde uma vida, e o único jeito de contra-atacar os fantasmas é pegando uma das quatro pílulas piscantes (insira aqui a piada morta e sem graça que Pac-Man é uma rave), que torna os fantasmas vulneráveis e você pode comer eles. Quando você pega todas as pílulas da fase, a próxima fase é exatamente igual, mas o jogo fica um pouco mais difícil, e repete-se o processo tentando alcançar o máximo de pontos que você conseguir.

Os detalhes estão no comportamento dos fantasmas e no planejamento de cada jogador. Cada um dos fantasmas é um mesmo modelo visual com uma cor diferente, mas cada um deles tem uma IA própria: no início do jogo (e em intervalos regulares depois disso), cada um dos fantasmas irá rodear um dos quatro cantos do labirinto – o vermelho no canto superior direito, a rosa no canto superior esquerdo, o azul no canto inferior direito e o laranja no canto inferior esquerdo – e depois de um tempo, cada um seguirá um caminho próprio em relação a Pac-Man.

O vermelho (chamado Blinky) persegue diretamente Pac-Man procurando ficar em sua cola o tempo todo, fazendo o caminho mais rápido para chegar até ele. A rosa (chamada Pinky) procura fazer emboscadas, cortando caminhos para cercar Pac-Man e pegá-lo desprevenido. O azul (Inky) trabalha diretamente com Blinky, se posicionando a uma distância sempre relativa a ele e procurando formar emboscadas em conjunto. Por fim, o laranja (Clyde) faz o que quiser, indo para direções semi-aleatórias, o que pode ser uma bênção ou uma maldição dependendo da situação. Por fim, se Pac-Man tiver pego uma pílula piscante (chamada oficialmente de “power pellet“), os fantasmas irão fazer o possível para se afastar e se espalhar pelo mapa, para que Pac-Man consiga comer o mínimo possível de fantasmas.

Por fim, para cada fantasma que você coma, maior a pontuação que você consegue, então montar uma estratégia onde você consegue decidir o melhor caminho para juntar os fantasmas perto uns dos outros para conseguir o maior escore cada vez que pega uma das quatro power pellets para maximizar os ganhos de pontos é sempre algo potencialmente diferente a cada jogo. Esses detalhes não só trazem à tona o que tornou Pac-Man tão elegante e famoso, mas também é muito importante para a personalidade, deixando o jogo um pouco mais vivo e memorável, unido a expressões faciais simples e os nomes engraçadinhos pra cada fantasma e uma jogabilidade sólida com muita margem para melhoria e uma pitada de aleatoriedade, que no final estabeleceram o Pac-Man original como o verdadeiro clássico que ele é.

Momentos antes da desgraça acontecer: Blinky e Inky me perseguem e Pinky se apronta para me pegar de surpresa no canto da tela. Versão de Pac-Man Museum +!

Esse mesmo design de jogo tão sagaz e viciante é o que tentaria ser replicado nos próximos lançamentos – com resultados mistos, mas os próximos jogos da época iriam trazer coisas novas à tona de acordo com o avanço da tecnologia e ideias novas para aumentar ainda mais o escopo. Usemos mais um exemplo: Galaga é essencialmente uma melhoria de Galaxian, que em si era uma melhoria da fórmula que Space Invaders trouxe. É um jogo de uma única tela, onde novos grupos de aliens (os DEMÔNIOS MORTÍFEROS, se você for olhar pela capa de NES do jogo) vão voando para dentro da tela (diferente de Space Invaders onde eles só apareciam! Uau, tecnologia!) e você precisa explodir todos eles pra avançar para a próxima fase. Você só pode atirar duas vezes antes de ter que esperar que as balas vão para fora da tela, então precisa cadenciar seus tiros para atingir os aliens sem ficar indefeso.

Os aliens comuns podem voar até você em tentativa de esbarrar ou atirar em sua direção, e às vezes até se multiplicar, mas os maiores (aqueles verdinhos que viraram troféu em Smash Bros.) podem usar um raio de tração para capturar a sua nave, o que não só consome uma das suas vidas restantes mas dá aos aliens um novo aliado, fazendo com que eles controlem sua antiga nave e usem ela contra você.

O detalhe é: se você conseguir derrotar o alien captor enquanto ele voa em sua direção (não, ele não pode estar parado no topo da tela), você pode recuperar a nave antiga – e agora, você tem duas naves ao mesmo tempo, uma do lado da outra, com direito a quatro tiros por vez! O problema é: se você errar a mira, pode destruir a nave antiga em vez do alien, e se atirar no alien cedo demais, você não recupera a sua nave antiga e agora terá que destruí-la. Risco grande, mas recompensa grande! Mais uma vez, esses pequenos detalhes são o que realmente fazem desses jogos tão divertidos e viciantes.

Alguns outros exemplos de jogos notáveis seriam Donkey Kong, que começaria a popularizar o tipo de jogo de plataforma, com seus elementos de aleatoriedade e ainda mais personalidade, Dig Dug que traria um aspecto musical ao jogo (mesmo que BEM repetitivo), Tower of Druaga que fez uma espécie de protótipo de RPG (que veio inclusive a inspirar Dragon Quest), Gradius com suas fases de rolagem lateral em tempo real, dentre vários outros. Da metade ao final dos anos 80, já começaríamos a ver uma transição do estilo de jogos mais simples e limitados de uma tela só ou de simples rolagem lateral para coisas mais complexas, dado ao avanço da tecnologia e da popularização de consoles de mesa ou computadores, e isso levaria a criação de clássicos mais tardios como Ghosts n’ Goblins ou Street Fighter II, mas esses são jogos criados após a “Era de Ouro” dos arcades, mais próximas dos anos 90 em lançamento e criação, e para esse texto, quero me ater aos anos 80 e essa famosa “Era de Ouro”. Não se preocupe, os jogos de arcade dos anos 90 vão ganhar suas menções, só não agora. Em breve.

OS JOGOS INDIE E A NOVA TRINDADE ABENÇOADA

Com o passar do tempo, enquanto os grandes manda-chuvas da época de arcade buscavam se reinventar pra caber melhor no cenário competitivo atual (com resultados variados) e eventualmente relançariam seus jogos antigos de um jeito ou de outro, como mencionado anteriormente, nossos queridíssimos desenvolvedores independentes trariam suas próprias interpretações e invenções únicas dessa época que muitos tem nostalgia. A cena indie, assim como os jogos do estilo arcade, são esferas do mundo dos jogos muito queridas pra mim, por diferentes motivos.

Os jogos de arcade são alguns dos meus primeiros contatos com jogos em geral, sendo meu primeiro videogame uma cópia do NES, chamada Phantom System – algo similar ao PolyStation e adjacentes, que sempre me fazem rir e provavelmente dão muita dor de cabeça às empresas – que vinha com aqueles cartuchos de 100 jogos em um, e muitos desses jogos eram ports de jogos de arcade e jogos do mesmo estilo. A trilogia Donkey Kong (não, não a trilogia Country, existe uma trilogia antes dessa), Popeye, Joust, Balloon Fight, Pac-Man, dentre muitos outros – todos jogos que joguei muito, antes de ganhar um Super Nintendo e me apaixonar de vez por esse mundo novo de jogos.

Já a cena indie tem sido a minha favorita nos últimos anos por ter tanta criatividade e dar tantos jogos de cores e estilos diferentes – em uma época onde os desenvolvedores mais famosos estão mais preocupados em avançar a tecnologia e fazer coisas tecnicamente impressionantes, é extremamente refrescante ver jogos com um escopo menor e preocupações mais comuns a pessoas comuns, dando um sentimento de comunidade muito maior a essa cena do mundo de jogos.

Dito isto, vamos (finalmente) aos pratos principais, indo em ordem cronológica e começando por Annalynn.

ANNALYNN

Às vezes me incomodo um pouco com o tanto de espaço sobrando na tela, mas a bisel (esse é o nome) é tão colorida e cheia de personalidade!

Annalynn é um jogo que foi lançado em 2021 para Steam, e recentemente em 2023 para Switch, pelo desenvolvedor Cruise Elroy, e é um jogo especialmente inspirado por Pac-Man. Claro, há mais outras inspirações presentes, como Donkey Kong Jr. ou até mesmo Spelunker para NES, mas Pac-Man é uma das mais óbvias e presentes. Vamos do começo: em Annalynn, você controla a protagonista (duvido você descobrir o nome dela) em sua exploração de uma caverna a procura de ouro, mas como a vida nunca é fácil, ela acorda um grupo de cobras em sua chegada, que não toleram intrusos: Randy, Handy, Candy e Mike. A partir daí, você precisa pegar todas as moedas de ouro em vários labirintos nas cavernas, e ao pegar todas, você segue para a próxima fase. Enquanto isso, as quatro cobras vão te perseguir, cada uma com sua estratégia diferente, e o único jeito de contra-atacar é pegando jóias vermelhas que as cegam, deixando-as vulneráveis, e você então pode chutá-las pra fora da arena, temporariamente. Entende agora o que eu disse no começo desse parágrafo?

Na versão de Switch, você pode usar o famoso Tate Mode, que deixa a tela virada pra você usar o switch verticalmente fora da tv!

Apesar das similaridades e de andar por labirintos, Annalynn é também um jogo de plataforma, ou seja, você vai ter que pular e manobrar para os lados pra pegar todas as moedas em cada fase e desviar das cobras que constantemente pegam atalhos – pequenas portas no fundo do cenário – que só elas conseguem usar, cada uma tendo um comportamento diferente. Randy (vermelho) persegue Annalynn diretamente, procurando a porta que chegue o mais próximo possível dela, Handy (azul) trabalha diretamente com Randy e tenta arrumar emboscadas no mesmo nível de Randy, pegando as portas que deixem Annalynn cercada, Candy (roxa) procura as portas que estejam um pouco acima de Annalynn para cortar as possíveis rotas de fuga alcançadas com o botão de pulo, e Mike (verde) faz o que ele quiser. É ao mesmo tempo familiar e diferente o suficiente para que quem joga saiba o que esperar e ainda assim tenha uma experiência única. Detalhe importante: você consegue perceber que uma das cobras entrou em um dos atalhos porque elas fazem aquele sibilar familiar de uma cobra quando entram. E mais, como um bônus para diferenciar cada uma das cobras, você tem uma opção para colocar chapéus em cada uma delas! Menos o Mike, olha pra cara dele – dá pra perceber que ele tá cansado demais pra se importar com um chapéu.

A esse ponto, você já consegue perceber o porquê da recomendação de Annalynn: é um jogo que pega aquele conceito e design que funcionou tão bem em Pac-Man e traz ele para uma nova realidade: animações e expressões mais detalhadas (inclusive nas “cinemáticas” entre conjuntos de fases), um sistema de progressão de fases com cinco locais diferentes pra desbravar, novas mecânicas a cada local – deixando o jogo mais desafiador, uma trilha sonora bem-composta do início ao fim, a habilidade de poder continuar a cada game over (sacrificando metade da sua pontuação atual) e até uma batalha contra um chefe! Essa é a grande vantagem dos jogos indie bem inspirados por jogos antigos: você pode ter a mesma experiência de jogar um jogo clássico, mas com toda o conforto e qualidade do design de jogos atuais. Agrada jogadores novos, jogadores que já curtiam o gênero e pode até agradar puristas. Acessibilidade!

A trilha sonora de Annalynn é simples, mas muito bem composta e dá a impressão que o jogo todo está acompanhando a trilha, nas cinemáticas em específico – é quase como a trilha de um desenho animado da Hanna-Barbera ou Looney Tunes, e o timing é perfeito. É o tipo de composição simples que gruda muito fácil, e em vários momentos durante a escrita desse texto, tive as músicas do jogo tocando na minha cabeça, e só melhorou a sensação. O design de som também merece pontos por fazer coisas que eram problemas em outros jogos funcionarem melhor: todo mundo que jogou Pac-Man já superestimou o tempo que os fantasmas estavam vulneráveis, e alcançou o fantasma na hora que ele voltou ao normal, perdendo uma vida. Em Annalynn, quando as cobras estão vulneráveis, o jogo faz um som que parece uma vibração que vai aumentando de intensidade (o tom vai subindo), então você tem mais um indicativo de se ainda é possível chutar o Mike pra fora da fase ou se é hora de fugir, o que funciona excepcionalmente bem – contanto que você não se entregue à ganância!

Em resumo, Annalynn traz todo o charme e toda a beleza de um clássico em um pacote novo e cheio de razões para continuar voltando, como todo bom jogo de arcade. Está disponível via Steam ou Switch a um preço bem leve, e um bônus: a versão de Switch foi editada pela Summitsphere, empresa indie que fez Antonball Deluxe e está fazendo Antonblast, e você pode liberar e jogar como Dynamite Anton, o protagonista desses jogos (além de uma montanha de cores diferentes para os dois personagens, liberáveis através de desafios)! É uma mudança cosmética, mas é um jeito fácil de conquistar mais corações – e definitivamente conquistou o meu.

DONUT DODO

Com Annalynn, tivemos um jogo mais puxado para Pac-Man, mas outros ícones merecem suas menções honrosas, e o próximo jogo pega suas inspirações de um certo gorila e seu arquiinimigo encanador, mas com um animal com menos pêlo e mais penas, um protagonista com um trabalho um pouco mais doce e um gosto maior pelo caos multicolorido que jogos um pouco mais esquecidos trazem. Vamos falar de Donut Dodo.

Abrace o caos multicolorido que atrai todas as pessoas que olham de longe.

Lançado em 2022 pelo estúdio Pixel Games, para Steam e Switch, Donut Dodo é um jogo extremamente colorido, envolvendo o padeiro Billy Burns tentando recuperar seus donuts de um dodô vermelho gigante. Como mencionei anteriormente, o jogo tem um misto um pouco menos óbvio de inspirações, mas Donkey Kong e jogos como BurgerTime vem bastante à mente quando procuramos comparações com Donut Dodo: o protagonista perseguindo o antagonista, ambos sempre presentes na mesma tela, os objetivos espalhados pela tela enquanto você corre de vários inimigos ao mesmo tempo e tenta manter sua atenção em várias coisas, dentre algumas outras similaridades. Donut Dodo foi o primeiro jogo que joguei dentre os três desse texto, e um que realmente me fez abrir os olhos pros próximos jogos indies estilo arcade, então tenho ele a agradecer por me levar a fazer esse texto.

A estrutura de cada fase do jogo pede que você colete todas as donuts espalhadas por cantos específicos da fase pra poder liberar o caminho para pegar o donut gigante, visível próximo ao dodô vermelho e vigiado por ele, enquanto vários capangas menores como os ratos, fantasmas ou privadas (sim, o vaso sanitário é um inimigo nesse jogo, e ele é um verdadeiro pé-no-saco) tentam impedir seu progresso. Ao final de cada fase, o dodô rouba o donut gigante mais uma vez e você o persegue por cinco fases até chegar ao lar do dodô, mas esse não é o final imediato: em clássico estilo arcade, quando você chega na última fase, o jogo volta ao começo e te desafia a fazer mais um loop de todas as fases.

Com certos jogos, como Donkey Kong, esse loop é infinito e o jogo vai até suas vidas acabarem, mas Donut Dodo tem um final próprio, basta que você termine o segundo loop. O final não é nada de especial – e nem precisa ser, na verdade – mas o detalhe que faz valer a pena é que a mensagem de párabéns está escrita com um inglês completamente quebrado, uma referência a um tempo passado onde tradução de qualidade dos jogos era um verdadeiro luxo (fato que, inclusive, levou Gradius a ter seu nome: a intenção original era “Gladius”, que é o nome de uma espada – traduzida em português para “Gládio”).

Donut Dodo tem três modos de jogo, separados por dificuldade, dois modos com dois loops e um modo com apenas um, o segundo loop em sequência é sempre mais difícil que o primeiro, e com o aumento de dificuldade, os inimigos ficam mais rápidos e aparecem em maior quantidade. Os ratos (Sniffy) sempre vão ficar indo e voltando na mesma plataforma que estiverem, os fantasmas vão aparecer de um dos lados da tela e fazer um movimento ondulatório (que nem as cabeças de medusa em Castlevania), as privadas (Stinky) vão perseguir Billy diretamente, escalando e pulando para chegar até você, e qualquer outro inimigo que apareça faz um caminho específico pelo cenário até sair da tela.

Com os comportamentos mais simples, Donut Dodo é mais fácil de entender logo de cara, mas isso não significa que é um jogo fácil – como os oponentes se movem individualmente, você precisa prestar atenção em todos eles se quiser sobreviver, e com a adição de novas coisas para se preocupar e a velocidade aumentando, é muito fácil se perder no caos e acabar se prendendo em uma situação que te custa uma vida, mas não me entenda mal – Donut Dodo com certeza é caótico, mas é um jogo que recebe esse caos de braços abertos e faz ele funcionar extremamente bem a seu favor.

Essa fase pega um pouco de inspiração em Donkey Kong Jr. e suas várias partes de escalada

Coletar os donuts é a parte mais interessante e integral do jogo, por um simples motivo: pontuação. Veja bem, como a bisel mostra nas imagens acima, cada donut vale 25 pontos por si só, mas quando você coleta o primeiro de uma fase, um donut aleatório daquela fase vai começar a brilhar, e se você o pegar, ele vale 150 pontos, o que é mais de 5x da pontuação original – é um grande pulo! E aqui que mora o maior diferencial: cada donut brilhante que você pegar em sequência (sem pegar nenhum dos não-brilhantes enquanto isso) vai multiplicar esse valor pelo número de donuts brilhantes que você pegou em sequência, ou seja, o segundo vai valer 300 pontos, o terceiro vai valer 450, o quarto 600 e assim por diante, facilmente chegando na casa dos milhares! Nem tem comparação com os meros 25 pontos de um donut não-brilhante! Olha aí, você pode usar Donut Dodo até pra ensinar matemática básica pras crianças – e tem quem diga que os videogames são perda de tempo. Ridículo!

O maior problema de ir atrás unicamente dos donuts brilhantes é que cada fase vai pedir mais tempo de você, e mais tempo em uma fase significa mais possibilidade de errar e perder uma vida no processo, então algumas vezes você pode preferir apenas pegar os donuts normais pra seguir em frente, principalmente se a fase for mais complicada, mas já que Donut Dodo é um jogo de arcade, um dos pontos principais para jogar é tentar quebrar os recordes, seja o seu próprio ou de outra pessoa nos quadros de líderes online, sem falar que a cada 15000 pontos você ganha uma vida extra, então é fácil perceber que o jogo incentiva que você pegue os donuts brilhantes – consegue enxergar o conceito de risco vs. recompensa que já mencionei várias vezes durante o texto?

Além do mais, nada te impede de escolher pegar os donuts mais distantes ou mais complicados de pegar logo no início e depois focar nos brilhantes – não vai dar a mesma pontuação, mas deve ser suficiente pra conseguir mais algumas vidas extras! Por fim, é importante mencionar que um bônus de pontuação (visto na parte superior direita) é dado por completar uma fase mais rápido – quanto mais tempo você passa na fase, mais o bônus cai, até chegar a zero, o que é uma boa opção para quem prefere ativar a mentalidade de speedrun. Vale a pena pontuar que o bônus cai muito rápido, então se você decidir correr o mais rápido possível, espero que tenha treinado!

Donut Dodo é um jogo bem desafiador, e você não pode continuar de onde parou se perder todas as vidas, mas não merece nada menos do que minha alta recomendação, por seu amor visível à era que presta homenagem e aos jogos em que se inspirou. Por fim, Donut Dodo tem uma trilha sonora fantástica composta por Sean Bialo, ou Cosmic Gem, e não só é um deleite aos fãs de chiptune como casa perfeitamente com o tom caótico do jogo – as melodias e acordes disparam em um ritmo frenético e açucarado que não para – e você com certeza não quer parar enquanto escuta! Sério, dá uma escutada em Ferris Wheel Frenzy aqui – você não vai se arrepender!

MURTOP

O mais recente da Trindade Abençoada, lançado em Maio deste ano, nos traz volta aos reis indisputados (em minha opinião) da era de ouro dos arcades: Namco. Os reis das aventuras simples, viciantes, esquisitas e ainda assim cheias de charme que fizeram sucesso retumbante, e colocaram a ideia de música que reage à interação de quem joga em uma máquina de fliperama bem antes de música ser algo constante e esperado nos jogos com Dig Dug, mencionado anteriormente. Um clássico onde você escava uma plantação e aniquila todas as pestes com uma bomba. Não, não uma bomba explosiva – uma bomba de inflar coisas como pneus e balões. Entende porque eu falei que eram jogos estranhos? Pois é. Mas e se eu te dissesse que existe um jogo por aí que não usa uma bomba de ar, mas a bomba mais destrutiva em um cenário muito parecido? Vamos falar de Murtop.

Explosões multicoloridas e muitas, MUITAS toupeiras te esperam

Murtop é um jogo lançado pelo desenvolvedor Hiulit, estrelando uma coelha chamada Murti que quer recolher todas as cenouras que conseguir enquanto se livra de uma gangue de toupeiras furiosas porque Murti está cavando seus túneis – de certa forma, é um anti-Dig Dug, se você parar para pensar. Inclusive, Murtop é o que acontece se fundirmos esse clássico com algo relativamente mais recente: Bomberman. Sim, um Dig Dug onde você perde um pouco da esquisitice (só um pouco) e destrói tudo – inclusive você mesma, se não tiver cuidado – ao seu redor com explosões em forma de cruz? Pra quê melhor?

O objetivo principal em Murtop é destruir todas as toupeiras subterrâneas através de seus excrementos explosivos – sim, você literalmente defeca bombas em Murtop. O jogo literalmente diz isso na tela de tutorial. Com o apertar de um botão, um presente explosivo é depositado um espaço atrás de Murti que logo em seguida explode, deixando uma trilha explosiva em formato de cruz, atingindo toda a superfície que estiver escavada a seu alcance, que vai eliminar quaisquer toupeiras – e a própria coelha, como mencionado antes – na direção cardinal próxima.

Terminadas as toupeiras da fase, a próxima fase vem com mais toupeiras, vindo em três variantes, introduzidas pouco a pouco: Baldy (que carregam uma pá), Talpy (as de chapéu de construção) e Star-Nosed (as roxas de óculos). Baldy é a mais simples, se ela te ver, ela vai perseguir diretamente em fúria. Talpy é um pouco mais inteligente: Prefere jogar pedras pequenas de longe ao fazer contato visual, e as de óculos (Star-Nosed é um nome um pouquinho grande, e “nariz de estrela” não ajuda muito) resolvem que o método Indiana Jones é mais eficiente, jogando rochas gigantes de cima da tela. É exagero, mas é bem eficiente – que nem pescar com dinamite.

Murtop é um jogo sem fim, assim como Dig Dug, de modo que você só tem algumas fases diferentes e uma fase de bônus, alcançada por terminar um loop ou pegar o nabo colorido que pode aparecer no topo da tela, então é um jogo mais retrô ainda nesse sentido, e apesar de os outros exemplos da Trindade não apresentarem muito mais jogabilidade, a comparação ainda é importante. Porém, Murtop ainda é bem divertido de jogar, e não só é extremamente bem-vindo como mais uma revitalização do gênero como é mais um crossover que também usa do famoso exemplo do risco vs. recompensa, o que nunca vai ser ruim aos meus olhos.

O lance em Murtop é que com cada toupeira explodida, você ganha pontos (obviamente), mas se você conseguir posicionar duas ou mais toupeiras na explosão de uma mesma bomba, sua pontuação é multiplicada pelo número de toupeiras, podendo multiplicar a pontuação de uma mesma explosão em até 4x, e assim como em Dig Dug, espalhadas pelo cenário estão várias pedras, e ao passar diretamente embaixo de uma, elas caem diretamente para baixo até a areia mais próxima, o que também leva a potenciais combos maiores ainda se esmagar várias toupeiras de uma só vez – tudo depende da sua criatividade e habilidade!

Pontos extras pela opção de duas biséis diferentes – Detalhes pequenos assim são sempre apreciados! E sim, a versão de Switch também tem o famoso Tate Mode.

Murtop está disponível para PC e Switch, também a um preço bem convidativo, e apesar de ter menos opções em comparação com os outros dois da Trindade Abençoada (P.S.: Eu inventei esse termo nesse texto, os desenvolvedores dos jogos não têm relação um com o outro), ainda é uma nova interpretação de clássicos de outrora com ideias novas e divertidas. Murtop é o mais recente dos três jogos, e só posso esperar que venda bem e que em um futuro próximo eu esteja aqui voltando a falar de mais jogos como esses.

CONCLUSÃO – ESSE JOGO É PRA MIM?

Estivemos vendo detalhes e influências positivas sobre a era de ouro dos arcades por bastante tempo, e o tanto de vezes que mencionei o que faz desses jogos especial nem precisa ser relmebrado (apesar de eu estar mencionando de novo, olha só), acredito que a esse ponto dá pra entender o que faz desses jogos especiais ao meu ver. É sempre uma boa sensação em pegar um desses jogos no fim de um dia corrido ou entre as pausas de um trabalho e tentar bater o seu próprio recorde, ou ultrapassar aquela pessoa que ficou na sua frente por só alguns poucos pontos no placar de líderes – talvez você não consiga competir com o primeiro lugar, mas sair do trigésimo oitavo para o trigésimo sétimo é uma vitória pessoal, e deve ser celebrada, não acha? Agora rumo ao trigésimo sexto!

O maior problema com relação aos jogos de arcade (e esse problema ainda reverbera pela Trindade Abençoada) é que eles são jogos extremamente simples e repetitivos, e muitas vezes o elemento de aleatoriedade em alguns aspectos pode acabar irritando – perdi a conta de vezes de quando perdi uma vida em Donut Dodo porque coincidiu que todos os comportamentos aleatórios me deixaram em tremenda desvantagem, ou das vezes que por algum motivo Donkey Kong decidiu jogar um barril diretamente na minha direção, me custando uma vida que pareceu injusta, e isso com certeza irrita; mas essa mesma aleatoriedade é o que traz o sabor desses jogos de arcade.

A sensação de nenhum jogo ser inteiramente igual, enquanto ainda mantém uma mesma estrutura de fase e de design, e a ideia de estar sempre tentando se melhorar um pouco a cada dia, e não precisar se dedicar inteiramente àquele jogo, ser algo muito fácil de pegar por alguns minutos e largar por quanto tempo você quiser, são todas ideias que sintonizam muito bem comigo, e por isso amo de paixão esses jogos, e aí que está o ponto principal da questão – se esse tipo de design vai te conquistar ou não.

Se você ficou curioso, seja por não ter jogado esse tipo de jogo ainda ou de não tocar nele faz muito tempo, recomendo fortemente que você experimente alguns, de preferência em coletâneas como a Namco Museum, por oferecer vários clássicos diferentes, e portanto dar a oportunidade de tentar vários deles pra ver qual deles chama sua atenção. Se você já conhece os clássicos, por favor se presenteie com um dos jogos da Trindade Abençoada, e considere pegar os outros no futuro – são todos ótimas adições à biblioteca de qualquer pessoa que aprecie esses jogos rápidos e elusivamente profundos. O jogos de arcade são uma arte que saiu de moda por vários motivos, mas que merece ser apreciada hoje em dia, e os desenvolvedores indie estão aí pra provar esse ponto, e fico muito animado para o futuro desses jogos.

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Comentários

Olha... excelente texto. Esse é um problema que eu já vinha discutindo em meus círculos de amizade ha um bom tempo. Isso fica ainda mais evidente quando percebe-se a necessidade das grandes publishers de seguirem tendencias mais lucrativas não afetam apenas o game design em si, mas também as temáticas, narrativas, e até mesmo a direção de arte dos games. Vide a enxurrada de jogos de zumbis que tivemos na geração passada... Por falar em indies, eu vejo muito potencial para que os próximos AAA inovadores saiam deles. O orçamento ainda é um problema, mas financiamento coletivo já é uma realidade. Acredito que equipes extremamente competentes e comprometidas consigam levantar fundos para levar adiante o desenvolvimento de jogos desse nível.

O sorteio vai ser ao vivo via live???

Obrigado Igor! Seja bem-vindo ao Nintendo Fusion :)

Rapaz, que texto foda! Parabéns Renan! Fico cada mais feliz em ser Nintendista em tempos como esse (apesar de ainda não ter um Switch), saber que a Nintendo rema pesado contra essa maré cheia de lixo. Recentemente o designer da BioWare, Manveer Heir (Mass Effect) compartilhou que a EA só tem foco mesmo nas microtransações, que ainda viu gente gastando 15 mil dolares com cards de multiplayer do Mass Effect 3. Pra piorar agora tem o sistema de Loot Box, que está na moda, e a Warner empolgou com o Shadow of Mordor. Loot Box pra fechar campanha ou pra tentar competir online nos jogos, pra mim isso é praticamente o fim. A única esperança que tenho nessa industria que amo tanto são mesmo nos indies, Nintendo e algumas empresas. Espero que a Activision não estrague a Blizzard, pq apesar de Overwatch ter Loot Box, são completamente cosméticos, e eu acho isso bom até, pq jogar pra desbloquear coisas visuais é muito mais interessante e prazeroso que jogar pra tentar a sorte com um item específico pra ser mais competitivo com upgrades no status do personagem.

Não aparece para você no começo do texto? https://uploads.disquscdn.com/images/b809b035a7e4e21875dfe6af44cc2d10dccbe7c3eea556e1be57fe8018d72a32.png

cadê o tal formulário do Gleam? não vi link nenhum no texto... tá mal explicado isso...

Das publicadoras de games, a EA é sem duvidas a pior. Não foi atoa que foi escolhida como a pior empresa americana por dois anos consecutivos. Não quero parecer um hater, mas é essa filosofia de shooters multimilionários, com gráficos de ponta e extorquimento de dinheiro dos consumidores é que vai fazê-los fechar as portas. Isso fica evidente com o “apoio” da empresa ao Switch, não souberam mais uma vez ler o sucesso do console, e repetem os mesmos erros de uma década: investir pesado em gêneros supersaturados. E é interessante notar como o Iwata foi capaz de enxergar uma realidade mais de uma década á sua frente, e feliz que cada vez mais empresas adotam essa estratégia: jogos de menor orçamento e maior foco no público

Agora sim vou ter meu switch o/

Sim!

Qual é a exceção "imperdoável"? Chrono Trigger?

Reativei minha conta só pra promoção kkkk

Cara, não uso Twitter. Até tenho, mas nem lembro senha nem nada. Vamos ver se tenho sorte

Parabéns à todos nessa nova empreitada, o site é promissor!

Acho que o único defeito desse game foi ter requentado muitas fases, poderia ter sido apenas a GHZ, por exemplo. Mas fora isso é impecável.

sera que agora ganho o

Precisa compartilhar no Facebook. Nos outros lugares é opcional.

Eu preciso compartilhar o sorteio pelo facebook? Ou é preciso compartilhar em outro lugar?

Felipe Sagrado escreva-se em tudo para aumenta a change brother!!!!

Você pode participar sim, só não vai poder obter os dois cupons relacionados ao Twitter. :)

Boa tarde. Eu não uso o Twitter, então gostaria de saber se isso impede minha participação ou só diminui minhas chances?

? vou seguir o Renan aqui tbm