Há uma piada entre fãs de JRPG que descreve o progresso narrativo deste gênero como sendo um grande arco de protagonista adolescente que começa na escola ou em sua vila natal e culmina em uma conclusiva batalha épica contra Deus. Pode parecer uma forma simplista de descrever esse tipo de jogo, mesmo que a brincadeira tem sim um fundo de verdade. Mas quando um jogo te coloca durante todo o progresso contra deuses, figuras mitológicas e outras figuras folclóricas, será que o impacto das batalhas na experiência se torna algo corriqueiro e pouco marcante?
Shin Megami Tensei V é o quinto jogo numerado em uma franquia que tem mais spin-offs do que gostaria de ter durante seus primeiros anos de vida — tendo em vista que se tratava originalmente de uma adaptação da série de livros Digital Devil Story para o mundo dos jogos digitais. É também o primeiro a ser lançado (quase) simultaneamente em todo o mundo com dublagem de vozes em inglês e japonês. Esse marco por si só já é uma vitória, visto que Megami Tensei e suas subséries só vieram a se tornar populares no ocidente de uns anos para cá.
Em 2018, após empolgantes 25 horas na companhia de Shin Megami Tensei IV, fiquei completamente perdido em um dos mapas do jogo e acabei deixando-o de lado. Este é, portanto, meu segundo contato com SMT, mas a primeira vez que realmente me esforço (mesmo na dificuldade normal) para continuar jogando até o fim. Agora, mais de 80 horas depois das primeiras conversas em uma versão pacífica de Tóquio, posso dizer que entendo um pouco mais sobre o apelo da franquia.
Para jovens alunos em um colégio de ensino médio, tudo é o fim do mundo. Afinal, estamos falando da adolescência, período no qual é preciso aprender a lidar primeiramente com as questões pessoais para então se aventurar (e falhar miseravelmente) em resolver as questões do mundo. Não é o caso para alguns estudantes da Jouin High School que precisam decidir se vão tentar salvar sua realidade quando demônios começam a invadir Tóquio.
Após uma breve introdução ao mundo dos humanos, sofremos um acidente dentro de um túnel no presente e somos levados para uma versão destruída de Tóquio chamada Da’at. Por lá, descobrimos algumas informações sobre a relação entre esse infindável deserto de calamidades e a nossa realidade, e por que uma guerra descontrolada entre anjos e demônios reverbera para a dimensão dos humanos.
É também durante esse início de jogo que somos apresentados ao conceito de Nahobino, uma forma que representa a união entre Conhecimento e Vida. Narrativa e visualmente, isso acontece quando um demônio encontra e se funde a sua contraparte humana. Mecanicamente, é a única forma de sequer ter uma oportunidade de sobreviver à guerra contra Lucifer e lutar pelo Trono da Criação — qualquer que seja o destino do mundo a partir do sistema de alinhamento.
Durante o combate por turnos, nossa equipe é composta pelo próprio Nahobino e por mais três demônios — que, na série, nada mais são do que divindades, entidades, lendas, mitos, personagens fictícios e até personalidades históricas. O design das criaturas é certamente um dos pontos altos do jogo na minha opinião: preza muito pela criatividade e acerta na subversão de expectativas para figuras mais populares, como Zeus, Odin e Thor.
Assim como em outros jogos da série, cada demônio tem um conjunto de habilidades pré-definidas de acordo com sua natureza, podendo ser trocadas manualmente à medida que subimos de nível e desbloqueamos mais opções fixas de melhorias. Há também resistências, fraquezas e outros tipos de afinidades relacionadas aos tipos de dano (físico, elemental, mal-estar, etc.), sistema que governa a quantidade de turnos ganhos ou perdidos a cada rodada. Por último, há uma barra cumulativa de poder demoníaco (Magatsuhi) que nos permite o uso de habilidades especiais de dano, suporte, modificação de atributos e recuperação.
Tudo isso também se aplica ao protagonista, mas com uma diferença: sua derrota durante qualquer luta é sinônimo de Game Over — e, infelizmente, isso é uma característica da série pelo que pesquisei. Há algumas formas de evitar esse tipo de transtorno, como habilidades passivas que garantem uma segunda tentativa, mas a imprevisibilidade dos encontros (mesmo não sendo aleatórios) em algumas regiões pode ser bastante perigosa.
Apesar de não tão versáteis quanto o bracelete inteligente de SMT IV, as leyline founts são pontos de checagem espalhados pelos mapas que visitamos em SMT V. Somos transportados à última fonte visitada com apenas um toque de botão, onde podemos recuperar as energias, viajar para outras fontes desbloqueadas, salvar o progresso, negociar itens e adentrar o chamado World of Shadows.
Apresentado pela misteriosa Sophia, esse último nos permite fundir, registrar e consultar demônios de nível igual ou menor ao do Nahobino. Algumas habilidades especiais têm animações exclusivamente programadas para um único demônio — portanto, não é possível passá-las para frente —, mas a maioria delas pode ser escolhida para ser usada por criaturas mais poderosas obtidas por fusão. Além disso, também é possível comprar milagres (vantagens permanentes) e manipular afinidades/habilidades a partir da opção Apotheosis.
A exploração em Shin Megami Tensei V só é justificada se você for atrás de coletáveis e tiver interesse nas side quests — algumas delas interessantes pela contextualização mitológica, mas nada espetacularmente imperdível. Não há muitos pontos de destaque espalhados pelos mapas que nos motivem a explorá-lo pela curiosidade. Muito pelo contrário: tive bastante dificuldade para entender como alguns viadutos, topos de edifícios e morros se interligavam ao nível das ruas, sendo impedido por minutos a fio de cumprir objetivos principais e secundários.
Há apenas duas dungeons no total, sendo que uma apresenta uma mecânica diferente de travessia e a outra é um labirinto pouco criativo. Alguns elementos nesses ambientes chegaram a me atrapalhar em certos momentos, mas senti falta de mais locais intricados como esses ao longo do jogo. Grande parte de sua trama é ambientada em desertos e ruínas urbanas que causam pouco impacto visual e muita confusão na exploração — mesmo que passem uma sensação de imensidão durante cutscenes e em alguns locais mais panorâmicos.
As negociações com demônios ainda não funcionam da forma como eu gostaria, mesmo sendo uma mecânica bastante tradicional da série. Há muita aleatoriedade associada às perguntas e respostas, geralmente resultando negativamente em uma rodada de ataques do oponente sem muitas explicações. Honestamente, eu já esperava que o jogo não iria conseguir lidar com esse problema recorrente, mas confesso que fui surpreendido pontualmente com algumas conversas entre demônios do mesmo tipo ou que se relacionam diretamente em alguma cultura mundo afora.
Em termos de desempenho técnico, o jogo roda a 30 quadros por segundo com frequentes quedas mesmo reproduzindo cenas pré-renderizadas. Essas quedas podem ser notadas enquanto jogamos especialmente quando um objeto se encontra um pouco mais distante, já que a animação roda a uma taxa bem menor de quadros por segundo e cresce à medida que nos aproximamos. Do ponto de vista de acessibilidade, tirando as dificuldades implementadas e a dublagem de vozes em inglês, não há muito aqui para aprimorar a qualidade de vida dos jogadores e jogadoras.
Comentários
Olha... excelente texto. Esse é um problema que eu já vinha discutindo em meus círculos de amizade ha um bom tempo. Isso fica ainda mais evidente quando percebe-se a necessidade das grandes publishers de seguirem tendencias mais lucrativas não afetam apenas o game design em si, mas também as temáticas, narrativas, e até mesmo a direção de arte dos games. Vide a enxurrada de jogos de zumbis que tivemos na geração passada... Por falar em indies, eu vejo muito potencial para que os próximos AAA inovadores saiam deles. O orçamento ainda é um problema, mas financiamento coletivo já é uma realidade. Acredito que equipes extremamente competentes e comprometidas consigam levantar fundos para levar adiante o desenvolvimento de jogos desse nível.
O sorteio vai ser ao vivo via live???
Obrigado Igor! Seja bem-vindo ao Nintendo Fusion :)
Rapaz, que texto foda! Parabéns Renan! Fico cada mais feliz em ser Nintendista em tempos como esse (apesar de ainda não ter um Switch), saber que a Nintendo rema pesado contra essa maré cheia de lixo. Recentemente o designer da BioWare, Manveer Heir (Mass Effect) compartilhou que a EA só tem foco mesmo nas microtransações, que ainda viu gente gastando 15 mil dolares com cards de multiplayer do Mass Effect 3. Pra piorar agora tem o sistema de Loot Box, que está na moda, e a Warner empolgou com o Shadow of Mordor. Loot Box pra fechar campanha ou pra tentar competir online nos jogos, pra mim isso é praticamente o fim. A única esperança que tenho nessa industria que amo tanto são mesmo nos indies, Nintendo e algumas empresas. Espero que a Activision não estrague a Blizzard, pq apesar de Overwatch ter Loot Box, são completamente cosméticos, e eu acho isso bom até, pq jogar pra desbloquear coisas visuais é muito mais interessante e prazeroso que jogar pra tentar a sorte com um item específico pra ser mais competitivo com upgrades no status do personagem.
Não aparece para você no começo do texto? https://uploads.disquscdn.com/images/b809b035a7e4e21875dfe6af44cc2d10dccbe7c3eea556e1be57fe8018d72a32.png
cadê o tal formulário do Gleam? não vi link nenhum no texto... tá mal explicado isso...
Das publicadoras de games, a EA é sem duvidas a pior. Não foi atoa que foi escolhida como a pior empresa americana por dois anos consecutivos. Não quero parecer um hater, mas é essa filosofia de shooters multimilionários, com gráficos de ponta e extorquimento de dinheiro dos consumidores é que vai fazê-los fechar as portas. Isso fica evidente com o “apoio” da empresa ao Switch, não souberam mais uma vez ler o sucesso do console, e repetem os mesmos erros de uma década: investir pesado em gêneros supersaturados. E é interessante notar como o Iwata foi capaz de enxergar uma realidade mais de uma década á sua frente, e feliz que cada vez mais empresas adotam essa estratégia: jogos de menor orçamento e maior foco no público
Agora sim vou ter meu switch o/
Sim!
Qual é a exceção "imperdoável"? Chrono Trigger?
Reativei minha conta só pra promoção kkkk
Cara, não uso Twitter. Até tenho, mas nem lembro senha nem nada. Vamos ver se tenho sorte
Parabéns à todos nessa nova empreitada, o site é promissor!
Acho que o único defeito desse game foi ter requentado muitas fases, poderia ter sido apenas a GHZ, por exemplo. Mas fora isso é impecável.
sera que agora ganho o
Precisa compartilhar no Facebook. Nos outros lugares é opcional.
Eu preciso compartilhar o sorteio pelo facebook? Ou é preciso compartilhar em outro lugar?
Felipe Sagrado escreva-se em tudo para aumenta a change brother!!!!
Você pode participar sim, só não vai poder obter os dois cupons relacionados ao Twitter. :)
Boa tarde. Eu não uso o Twitter, então gostaria de saber se isso impede minha participação ou só diminui minhas chances?
? vou seguir o Renan aqui tbm