Faziam 12 anos desde a última vez que joguei um Assassin’s Creed substancialmente — foi Assassin’s Creed III, que joguei no Wii U na expectativa de ver o final da saga de Desmond Miles. Como um todo, foi uma experiência tão decepcionante que acabei nunca mais conseguindo voltar à série. Aqui e ali, joguei um pouco de Black Flag, Unity, Syndicate, Origins, e Odyssey, mas nunca mais do que o comecinho.
Mas Assassin’s Creed Shadows vem me intrigando. Obviamente, é o jogo que imaginávamos ser óbvio desde 2007, mas a Ubisoft levou mais de 15 anos para levar os assassinos à terra que os inspirou. Faz certo sentido — Assassin’s Creed é um jogo sobre ninjas em outros contextos históricos. Seria então Shadows apenas um jogo sobre ninjas?
Minha maior curiosidade é como Shadows se compara aos Assassin’s Creeds antigos que eu joguei, e como se posiciona no cenário de jogos open-world modernos. Muito tempo se passou desde as aventuras de Altaïr e Ezio. O que será que a Ubisoft aprendeu desde então?
Tradicionalmente, a série Assassin’s Creed se passa em momentos e locais históricos pouco explorados pelos videogames. Desta vez, encontramos um cenário muito conhecido: o Japão entre a era feudal e o período Edo. Apenas nos últimos anos, tivemos Sekiro: Shadows Die Twice, Ghost of Tsushima, Nioh, Like a Dragon Ishin! e Rise of Ronin. Devo ter esquecido algum… Ah é! Pokémon Legends: Arceus.
Cada um desses jogos traz uma abordagem diferente, é claro. São diferentes períodos, partes diferentes do Japão e diferentes graus de realismo vs. fantasia. Mas não deixa de ser um cenário conhecido, com certeza muito mais do que Síria, Itália, Grécia ou Egito.
Em particular, Shadows se passa no final do século XVI, uns 200 anos após a história de Jin Sakai e outros 200 antes da de Sakamoto Ryōma. São anos marcados pela chegada dos portugueses ao arquipélago nipônico. Sendo os primeiros europeus a chegarem lá, e percebendo que a civilização japonesa era mais avançada e organizada do que eles haviam encontrado nas Américas, os jesuítas portugueses negociavam com o daimyō Oda Nobunaga para construir igrejas na região e fazer trocas vantajosas para ambos os lados.
Nesse contexto são apresentados nossos dois protagonistas. Por um lado, temos Diego, um escravo dos portugueses trazido de alguma terra distante. Nobunaga se impressiona com a capacidade física do rapaz e acaba negociando com os portugueses para tê-lo como guarda pessoal. Após um treinamento intensivo, Diego assume o nome japonês Yasuke.
Do outro lado, acompanhamos Naoe, uma jovem de Iga, um clã de shinobis que se opõem ao expansionismo territorial de Nobunaga. Após serem invadidos pelas forças de Nobunaga, Naoe perde sua vila e sua família, decidindo então exaltar vingança contra o daimyō.
Nas primeiras dúzias de horas, somos apresentados essas origens e motivações dos personagens, que eventualmente acabam encontrando um objetivo comum e tornando-se aliados. A narrativa é espalhada ao longo de diversas cutscenes e flashbacks, o que fica um pouco cansativo, até mesmo em termos de jogabilidade. Por exemplo, após umas 20 horas de jogo, joguei a cena de treinamento de Yasuke, que era praticamente um tutorial de combate mais básico do que veio antes.
A escolha de Yasuke e Naoe como protagonistas é feliz. Ambos são personagens que fogem do padrão samurai/ninja e garante a Shadows uma posição única em uma estética de jogos tumultuada. Também é importante que os dois são muito diferentes, tanto em suas personalidades durante as cenas quanto em seus movimentos de combate. Enquanto Naoe é ágil e furtiva, Yasuke é monstruosamente forte e resistente. Só não espere o parkour tradicional da franquia com o samurai.
Após uma infinitude de cutscenes e tutoriais, eventualmente ficamos livres para explorar o mundo — com algumas restrições. Minha surpresa aqui foi o quanto Shadows ainda se assemelha com os Assassin’s Creeds de antigamente… mas talvez ainda mais com Far Cry. O loop principal fora das missões principais é encontrar pontos altos para revelar parte do mapa, encontrar bases inimigas para conquistar, e assassinar alvos que estão por aí no mundo.
É um loop funcional e agradável, mas me pergunto o quanto é durável. Eu não explorei nem metade do mapa e estou começando a achar repetitivo. E o mapa é realmente enorme, repleto de torres e castelos e templos e cidades. Cada um bonito e divertido por si só, mas com pouca variedade entre eles.
Comparado ao Assassin’s Creed do velho testamento, o que é muito diferente para mim é o sistema de progressão. Com um sistema de armas e XP estilo RPG e (sub-)regiões categorizadas por nível, a impressão que fica é algo como “minha faca tem que estar mais afiada pra poder assassinar esse cara”.
“Mas Renan,” meu caro leitor pode estar pensando, “videogames e RPGs em particular são sempre assim, com números arbitrários indicando o que você precisa para matar algo.” De fato, é verdade (e é um dos motivos pelos quais eu não gosto muito de RPGs) — mas em jogos de fantasia isso pelo menos é representado por criaturas cada vez maiores e mais medonhas. No contexto um pouco mais realista de Assassin’s Creed, são dois humanos aparentemente idênticos, mas um é Lv. 10 e outro é Lv. 25, então minha faca não funciona do mesmo jeito.
Isso não é tanto um problema para restringir o jogador e fazer uma progressão mais gradual no mapa, mas acaba ficando chato quando uma sequência de missões de história não podem ser feitas em seguida por causa de saltos de nível.
É inevitável traçar comparações mentais entre Assassin’s Creed Shadows e Ghost of Tsushima, jogo tão inspirado por Assassin’s Creeds anteriores que agora serve de inspiração para a mais recente entrada na série.
Mas, jogando, pensei muito mais em dois outros open-worlds: The Legend of Zelda: Breath of the Wild e Elden Ring, dois jogos que considero como referências em termos de design de mundo. Ambos jogos são muito bons em estimular a curiosidade do jogador e permitir uma progressão ludonarrativa não-linear baseada nessa curiosidade. Na Hyrule de BotW, a filosofia dos “triângulos” nos faz sempre querer saber o que tem atrás de um obstáculo. Já as Terras Intermédias de Elden Ring são repletas de formações geográficas e arquiteturais misteriosas, e logo aprendemos que locais assim hospedam chefes e recompensas.
Assassin’s Creed Shadows, por sua vez, se passa em um simulacro da região de Kansai, onde se encontram cidades como Osaka e Kyoto. Seguindo a geografia da região de perto, os artistas da Ubisoft parecem estar constritos a criar cenários parecidos com os reais, que são belíssimos, mas obviamente não atingem os níveis de surpreendente que jogos mais fantasiosos.
Até aí tudo bem. O jogo puxa também uma página de The Witcher 3 ao oferecer um modo de quests mais imersivas. Ao invés de indicar exatamente onde encontrar um objetivo, temos 2-3 pistas e opcionalmente podemos enviar um espião para investigar uma área do mapa e afunilar nosso espaço de busca. É um sistema legal que nos incentiva a engajar mais com o próprio mapa, pois temos que pensar mais nas localizações de locais em relação a outros.
Mas isso dificilmente acontece de forma orgânica e as dicas iniciais às vezes vêm de um NPC, às vezes vêm de vozes da nossa cabeça. E, no fim, após afunilar a busca, acaba sendo uma procura por agulhas em palheiros abusando o botão LT/L2 para procurar um ponto azul na tela. Então engajamos com o mapa, mas não tanto com o próprio cenário em tela.
Talvez seja demais esperar isso de um jogo da Ubisoft que tenta apelar para todos os públicos imagináveis, mas minha vontade seria jogar com ainda menos orientações das quests, me permitindo apenas seguir minha curiosidade e avançando nas quests por acaso. Com algumas sidequests é possível — assassinei alguns membros de facções antes de saber sobre tal facção. Mas as missões principais exigem certas ações em certa ordem, e por vezes me encontrei procurando um NPC para me ajudar um castelo que eu havia apenas terminado de invadir.
Ao longo das últimas semanas, frequentemente senti muita vontade de jogar Assassin’s Creed Shadows após um dia de trabalho. Liguei o Xbox e mergulhei no jogo por uma ou duas horas nas noites de semana. Às vezes ligava o estéreo para ouvir o jogo com claridade, outras colocava os fones de ouvido para ouvir um podcast enquanto matava uns bandidos ou invadia um castelo. Em todos esses casos, sempre foi bem relaxante.
Há um certo zen em me afundar em um jogo desses, que exige uma certa quantidade de raciocínio e estratégia mas não tanto. Mas, muitas vezes, encontrei-me insatisfeito ao final de uma sessão dessas. Pensando novamente em Elden Ring, tive momentos similares com aquele jogo, mas ao final geralmente tinha a emoção de derrotar algum chefe diferente, mesmo que pequeno. No Shadows as atividades começam a se tornar repetitivas muito rápido, e ao desligar o Xbox me questionei diversas vezes se aquele tempo tinha sido bem gasto.
Talvez seja um reflexo da minha vida no momento, em que tenho muitas atividades importantes para fazer e tento ser mais cuidadoso com meu tempo livre. Mas também é curioso que essa linha de raciocínio me fez dedicar energias a outras tarefas mais “relevantes” — como, por exemplo, estudar um pouco de japonês. E ainda assim, com tudo isso na cabeça, estou com vontade de continuar jogando assim que terminar de escrever este texto. É realmente um jogo cativante, só tenho certeza que é pelos melhores motivos.
Logo ao iniciar o jogo, somos confrontados com algumas opções, e eu fiquei muito feliz de ver algumas que nunca tinha visto num videogame.
A primeira é o “modo canônico”, que pula árvores de diálogo para que cenas narrativas sempre considerem a escolha “correta” dos personagens. Eu nunca gostei muito de árvores de diálogo em jogos, então com certeza ativei esse modo.
Outra é o “modo imersivo”, que ajusta o idioma de áudio para que os personagens falem o idioma que deveriam falar em cada momento. Em geral é japonês, mas também tem algumas cenas em português envolvendo Yasuke/Diego e os padres jesuítas. Boa sorte entendendo português europeu do século XVI, mas eu fortemente recomendo essa opção, ao invés de ouvir dubladores falando em inglês com sotaque.
Também tem os supracitados modo de exploração. O padrão são as quests menos guiadas, com dicas geográficas das destinações, mas também podemos deixar isso de lado e ativar marcadores de quest tradicionais.
Quatro anos e meio após os lançamentos do Xbox Series X e PlayStation 5, Shadows é o primeiro jogo da série lançado exclusivamente para a nova geração. E isso é visível pela ambição técnica do jogo, talvez o mundo aberto mais bonito até agora. Nos consoles, a nova versão da engine da Ubisoft conta com sombras e dispersão de luz usando ray-tracing, enquanto reflexos ficam apenas na versão de PC.
O custo disso é o desempenho — os consoles só renderizam a nova iluminação a 30 ou 40 quadros por segundo. Com uma TV 120Hz HDR, o modo 40fps é uma excelente pedida: mantém todas as firulas gráficas com uma pequena redução de resolução, mas com uma sensação muito mais fluida que em 30. Apenas uma área, a nossa base, força a taxa de quadros a 30, causando uma sensação esquisita ao visitá-la.
Existe ainda um modo 60fps, mas logo eu não senti vontade de usá-lo. Usando a iluminação antiga, esse modo perde muitos dos efeitos que tornam este jogo visualmente especial, e não é particularmente mais agradável de controlar. Por sorte, todos os modos mantém muito bem a taxa de quadros esperadas, então a escolha vai mesmo do gosto do jogador.
Vale notar que o modo fotografia é ótimo, e em diversos momentos pausei a ação para capturar um instante marcante. Isso ressalta muito bem os sistemas da engine, incluindo a iluminação em diferentes oras do dia, simulação de eventos climáticos como ventanias e tempestades, e as transições entre as estações do ano.
Comentários
Olha... excelente texto. Esse é um problema que eu já vinha discutindo em meus círculos de amizade ha um bom tempo. Isso fica ainda mais evidente quando percebe-se a necessidade das grandes publishers de seguirem tendencias mais lucrativas não afetam apenas o game design em si, mas também as temáticas, narrativas, e até mesmo a direção de arte dos games. Vide a enxurrada de jogos de zumbis que tivemos na geração passada... Por falar em indies, eu vejo muito potencial para que os próximos AAA inovadores saiam deles. O orçamento ainda é um problema, mas financiamento coletivo já é uma realidade. Acredito que equipes extremamente competentes e comprometidas consigam levantar fundos para levar adiante o desenvolvimento de jogos desse nível.
O sorteio vai ser ao vivo via live???
Obrigado Igor! Seja bem-vindo ao Nintendo Fusion :)
Rapaz, que texto foda! Parabéns Renan! Fico cada mais feliz em ser Nintendista em tempos como esse (apesar de ainda não ter um Switch), saber que a Nintendo rema pesado contra essa maré cheia de lixo. Recentemente o designer da BioWare, Manveer Heir (Mass Effect) compartilhou que a EA só tem foco mesmo nas microtransações, que ainda viu gente gastando 15 mil dolares com cards de multiplayer do Mass Effect 3. Pra piorar agora tem o sistema de Loot Box, que está na moda, e a Warner empolgou com o Shadow of Mordor. Loot Box pra fechar campanha ou pra tentar competir online nos jogos, pra mim isso é praticamente o fim. A única esperança que tenho nessa industria que amo tanto são mesmo nos indies, Nintendo e algumas empresas. Espero que a Activision não estrague a Blizzard, pq apesar de Overwatch ter Loot Box, são completamente cosméticos, e eu acho isso bom até, pq jogar pra desbloquear coisas visuais é muito mais interessante e prazeroso que jogar pra tentar a sorte com um item específico pra ser mais competitivo com upgrades no status do personagem.
Não aparece para você no começo do texto? https://uploads.disquscdn.com/images/b809b035a7e4e21875dfe6af44cc2d10dccbe7c3eea556e1be57fe8018d72a32.png
cadê o tal formulário do Gleam? não vi link nenhum no texto... tá mal explicado isso...
Das publicadoras de games, a EA é sem duvidas a pior. Não foi atoa que foi escolhida como a pior empresa americana por dois anos consecutivos. Não quero parecer um hater, mas é essa filosofia de shooters multimilionários, com gráficos de ponta e extorquimento de dinheiro dos consumidores é que vai fazê-los fechar as portas. Isso fica evidente com o “apoio” da empresa ao Switch, não souberam mais uma vez ler o sucesso do console, e repetem os mesmos erros de uma década: investir pesado em gêneros supersaturados. E é interessante notar como o Iwata foi capaz de enxergar uma realidade mais de uma década á sua frente, e feliz que cada vez mais empresas adotam essa estratégia: jogos de menor orçamento e maior foco no público
Agora sim vou ter meu switch o/
Sim!
Qual é a exceção "imperdoável"? Chrono Trigger?
Reativei minha conta só pra promoção kkkk
Cara, não uso Twitter. Até tenho, mas nem lembro senha nem nada. Vamos ver se tenho sorte
Parabéns à todos nessa nova empreitada, o site é promissor!
Acho que o único defeito desse game foi ter requentado muitas fases, poderia ter sido apenas a GHZ, por exemplo. Mas fora isso é impecável.
sera que agora ganho o
Precisa compartilhar no Facebook. Nos outros lugares é opcional.
Eu preciso compartilhar o sorteio pelo facebook? Ou é preciso compartilhar em outro lugar?
Felipe Sagrado escreva-se em tudo para aumenta a change brother!!!!
Você pode participar sim, só não vai poder obter os dois cupons relacionados ao Twitter. :)
Boa tarde. Eu não uso o Twitter, então gostaria de saber se isso impede minha participação ou só diminui minhas chances?
? vou seguir o Renan aqui tbm