Por vezes basta um gatilho para o que está abaixo da superfície vir à tona. De forma explosiva como uma manada de infectados, ou de maneira mais sútil no olhar do homem que vê o desespero da perda de uma jovem ressurgir em sua trajetória. O quinto episódio de The Last of Us prossegue a partir dos conflitos estabelecidos no anterior, formando um dupla de capítulos fechados em si no arco de Kansas City, mas de grande relevância na trama central da temporada.
Começamos o episódio acompanhando de forma mais clara o processo de queda da FEDRA na cidade, e vendo como os irmãos Henry (Lamar Johnson) e Sam (Keivonn Woodard) chegaram até o ponto retratado na última cena da semana passada: o encontro com Joel e Ellie, interpretados por Pedro Pascal e Bella Ramsey. Os primeiros momentos do episódio constroem a antagonista Kathleen (Melanie Lynskey) na linha da fala mansa e pulso firme. Seguindo o tom do episódio anterior, a líder da resistência causa incomodo na forma como ordena mortes e caçadas como se pedisse um funcionário para entregar um documento em outro escritório. Ela, também, possui algo abaixo da superfície.
Já os irmãos, perseguidos pela milícia armada, vão sendo apresentados em sua intimidade. Existem duas diferenças em seus personagens em relação ao jogo: Sam é surdo, e Henry dá mais espaço para a infância e criatividade de seu jovem irmão, quando no game de 2013 pedia mais pragmatismo. Vemos o jovem garoto pintar o sótão em que estão escondidos aguardando o personagem assassinado por Kathleen no quarto episódio. Imagens dele como super herói, Super Sam. Em um dos enquadramentos, enquanto Henry espia Joel trocando tiros com homens da milícia, vemos também o Super Henry. Veremos, no fim do episódio, o Super Joel e, sobretudo, a Super Ellie.
Keivonn Woodard está adorável no papel de Sam, e a escolha da produção por adaptar a personagem como uma criança surda acerta na representatividade e também na forma como trabalha a narrativa do episódio: em muitos casos Sam só vai entender o que está sendo conversado quando Henry o explica em Libras, em outros o garoto usa seu bloco para trocar frases escritas, gerando espaços de expectativa e reação no processo da escrita.
Enquanto acompanhamos a recriação do trecho dos esgotos, com direito a um aceno ao personagem Ish, vemos Ellie e Sam fazerem o que crianças e jovens precisam e devem fazer em boa parte de seu tempo: brincar, imaginar e se relacionar com outros de sua idade. Ellie, aqui, é razoavelmente mais velha que Sam, porém a adolescente abraça essa relação e esses momentos. Por outro lado, vemos uma Kathleen determinada em se vingar de Henry por este ter dedurado seu irmão, posteriormente morto.
A personagem transita entre racionalidade e o substrato emocional escondido por baixo de seu pragmatismo. Seu soldado mais próximo, aliás, reafirma que por mais que eles amassem o antigo líder, foi ela a pessoa responsável por terem resultados concretos na resistência contra a FEDRA.
Henry e Joel haviam conversado mais cedo, e nosso protagonista já colocou uma barreira inicial por Henry ser um x9, algo desprezado pelo contrabandista Joel. Mais para frente o rapaz procurado pela milícia expõe de forma mais honesta o caso: ele não era apenas um dedo-duro, mas também um traidor. A traição aconteceu pois Sam precisava de remédios que só a FEDRA possuía. Joel, então, entende e compreende a situação.
A montagem do episódio do ponto de vista espacial é sua parte mais esquisita. Os cortes rápidos na movimentação e a ocultação de trechos de passagem acabam gerando um senso de desorientação que talvez reflita o ir e vir da discussão entre o que fazer quando temos de um lado uma comunidade e de outro alguém que você ama, ou talvez a presença de Joel e Ellie aqui como forasteiros sem muita noção do mapa do lugar.
O fato é que os quatro heróis finalmente atravessam para o outro lado do perimetro de Kathleen e seu grupo. Ellie vai falando o quanto Joel no começo é fechado, mas logo se abre e é interrompida por um tiro de sniper. Em outro trecho diretamente adaptado do jogo, Joel se esgueira até o medíocre atirador e resolve tal situação. A milícia, entretanto, chega ao local com carros fortificados e muito poder de fogo. Na fuga de Ellie, Sam e Henry, Joel acerta um dos carros que se choca a uma casa causando um bom punhado de destruição ali.
Uma satisfeita Kathleen percebe que Henry está subjugado, afinal ela tem todo um destacamento de homens armados com ela. Os dois discutem posições: Henry coloca como algo óbvio a vontade de salvar uma criança, enquanto Kathleen apenas diz que crianças, como tantos outros, morrem. A racionalidade e a leitura prática disso pode ser efetiva e conseguir realizar coisas, o preço, entretanto, é a perda da humanidade.
Falando em coisas que deixam de ser humanas, havia algo por debaixo da superfície de Kansas City. Vemos sugerido no quarto episódio, e recebemos a informação de Henry mais cedo neste de que de fato existe um contingente bem grande de infectados abaixo da cidade. O carro cede, e dali surge uma multidão de estaladores, iniciando uma guerra aberta entre a milícia e a galera do fungo.
Todo esse trecho é bem interessante e filmado de maneira competente. A produção e a maquiagem continuam um ponto alto da série de The Last of Us, e toda a sequência vai passeando entre os momentos de ação mais rápidos e alguma desorientação, e os enquadramentos no rosto de Joel enquanto este vai se desesperando para manter a segurança de Ellie lá embaixo. Enquanto isso, Kathleen escapa enquanto seu soldado tenta segurar um gigantesco Bloater.
Nossa protagonista é seguida por uma criança estaladora dentro de um carro. A imagem perturba, indo na direção do que a antagonista havia dito: crianças morrem. Ellie escapa e, com ajuda de Joel, consegue salvar Henry e Sam de infectados. Kathleen chega para conseguir vingança em meio ao caos, mas é, ironicamente, morta pela criança “zumbi”.
O último trecho do episódio foca em um Joel se abrindo mais e convidando Henry e Sam para se juntarem a eles na viagem. Ellie, por sua vez, descobre que o garoto foi infectado quando este lhe escreve a pergunta “será que a pessoa continua a existir dentro do monstro?” e lhe mostra a perna. A jovem, agora Super Ellie, escreve que seu sangue é remédio, se corta e passa na ferida de Sam, abraçando-o e se comprometendo a ficar acordada com ele.
Pela manhã, Sam ataca Ellie, e vemos Henry desnorteado acertar a cabeça de seu irmão. Joel tenta conversar e acalmar o rapaz, mas este se suicida na frente de Ellie. Tanto no jogo quanto na série, o corte após esses eventos é bem rápido. Aqui temos Joel enterrando os corpos, e Ellie apenas pedindo para continuar a viagem. Sua expressão mudou. Se no jogo Henry impedia, de certa forma, Sam de se entregar à infância nesse mundo, aqui Ellie tem a sensação que não há espaço para isso. Os dois seguem, e vemos os dizeres de Ellie para Sam escritos no bloquinho: “I’m sorry”.
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O quinto episódio de The Last of Us reafirma a qualidade de produção do seriado. Reforça, também, o foco no desenvolvimento dramático dos protagonistas bem como das figuras coadjuvantes que aparecem em distintos arcos. A jornada de Henry e Sam colocam mais um espelhamento na jornada de Joel e Ellie, um ainda mais claro e direto em seu reflexo do que aquele entre Bill e Frank desenvolvido no belo terceiro episódio. Joel, mesmo nos momentos de ação e tensão, deixa transparecer sua preocupação com Ellie para além de um simples “pacote”.
Os irmãos Henry e Sam trazem o tema da escolha em proteger a pessoa amada às vezes em detrimento de um número maior de pessoas, ou de próprios valores e concepções. Kathleen e sua milícia aparecem como um contraponto prático e cru: é necessário fazer o que é necessário ser feito, e coisas ruins acontecem com todo mundo. Abaixo de tudo isso, havia ainda uma horda de infectados, um problema prático maior que se vingar de um traidor. Abaixo de toda a casca, há ainda amor e esperança no futuro em Joel. E isso o assusta.
Comentários
Olha... excelente texto. Esse é um problema que eu já vinha discutindo em meus círculos de amizade ha um bom tempo. Isso fica ainda mais evidente quando percebe-se a necessidade das grandes publishers de seguirem tendencias mais lucrativas não afetam apenas o game design em si, mas também as temáticas, narrativas, e até mesmo a direção de arte dos games. Vide a enxurrada de jogos de zumbis que tivemos na geração passada... Por falar em indies, eu vejo muito potencial para que os próximos AAA inovadores saiam deles. O orçamento ainda é um problema, mas financiamento coletivo já é uma realidade. Acredito que equipes extremamente competentes e comprometidas consigam levantar fundos para levar adiante o desenvolvimento de jogos desse nível.
O sorteio vai ser ao vivo via live???
Obrigado Igor! Seja bem-vindo ao Nintendo Fusion :)
Rapaz, que texto foda! Parabéns Renan! Fico cada mais feliz em ser Nintendista em tempos como esse (apesar de ainda não ter um Switch), saber que a Nintendo rema pesado contra essa maré cheia de lixo. Recentemente o designer da BioWare, Manveer Heir (Mass Effect) compartilhou que a EA só tem foco mesmo nas microtransações, que ainda viu gente gastando 15 mil dolares com cards de multiplayer do Mass Effect 3. Pra piorar agora tem o sistema de Loot Box, que está na moda, e a Warner empolgou com o Shadow of Mordor. Loot Box pra fechar campanha ou pra tentar competir online nos jogos, pra mim isso é praticamente o fim. A única esperança que tenho nessa industria que amo tanto são mesmo nos indies, Nintendo e algumas empresas. Espero que a Activision não estrague a Blizzard, pq apesar de Overwatch ter Loot Box, são completamente cosméticos, e eu acho isso bom até, pq jogar pra desbloquear coisas visuais é muito mais interessante e prazeroso que jogar pra tentar a sorte com um item específico pra ser mais competitivo com upgrades no status do personagem.
Não aparece para você no começo do texto? https://uploads.disquscdn.com/images/b809b035a7e4e21875dfe6af44cc2d10dccbe7c3eea556e1be57fe8018d72a32.png
cadê o tal formulário do Gleam? não vi link nenhum no texto... tá mal explicado isso...
Das publicadoras de games, a EA é sem duvidas a pior. Não foi atoa que foi escolhida como a pior empresa americana por dois anos consecutivos. Não quero parecer um hater, mas é essa filosofia de shooters multimilionários, com gráficos de ponta e extorquimento de dinheiro dos consumidores é que vai fazê-los fechar as portas. Isso fica evidente com o “apoio” da empresa ao Switch, não souberam mais uma vez ler o sucesso do console, e repetem os mesmos erros de uma década: investir pesado em gêneros supersaturados. E é interessante notar como o Iwata foi capaz de enxergar uma realidade mais de uma década á sua frente, e feliz que cada vez mais empresas adotam essa estratégia: jogos de menor orçamento e maior foco no público
Agora sim vou ter meu switch o/
Sim!
Qual é a exceção "imperdoável"? Chrono Trigger?
Reativei minha conta só pra promoção kkkk
Cara, não uso Twitter. Até tenho, mas nem lembro senha nem nada. Vamos ver se tenho sorte
Parabéns à todos nessa nova empreitada, o site é promissor!
Acho que o único defeito desse game foi ter requentado muitas fases, poderia ter sido apenas a GHZ, por exemplo. Mas fora isso é impecável.
sera que agora ganho o
Precisa compartilhar no Facebook. Nos outros lugares é opcional.
Eu preciso compartilhar o sorteio pelo facebook? Ou é preciso compartilhar em outro lugar?
Felipe Sagrado escreva-se em tudo para aumenta a change brother!!!!
Você pode participar sim, só não vai poder obter os dois cupons relacionados ao Twitter. :)
Boa tarde. Eu não uso o Twitter, então gostaria de saber se isso impede minha participação ou só diminui minhas chances?
? vou seguir o Renan aqui tbm