Terminado God of War: Ragnarök, resolvi voltar para o meu ambiente preferido dos videogames nos últimos tempos, o Game Pass. Já havia separado uma lista de prioridades: Signalis, Citizen Sleeper, Norco e Pentiment. Continuar Immortality e começar Return to Monkey Island estavam ali num segundo grupo de interesse. Entretanto, resolvi baixar o Vampire Survivors só para ver qual é, afinal uma partidinha para me inteirar do assunto bastaria antes de pegar algo para jogar seriamente. Nos dias seguintes, não abri nenhum desses jogos.
Vampire Survivors é bom a ponto de me fazer esquecer de tudo. É bom a ponto de termos dois textos em menos de dez dias sobre a mesma obra. É bom a ponto de eu considerar aceitável a sigla VS ficar com o Vampire Survivors e Vagrant Story que VSF. Mas para além das piadinhas ruins, assim como um bom número de jogadores, eu também fiquei viciado no título. Tentei refletir um pouco o porquê desse vício todo, e um dos fios veio de um dos primeiros vídeos do canal do Masahiro Sakurai.
O diretor de Super Smash Bros. Ultimate coloca a centralidade da relação entre risco x recompensa/ avanço x recuo como possível essência de um jogo, no sentido de qual a situação proposta para o ato de jogar. Em termos gerais, o espaço seguro não traz risco, mas também coloca quem joga longe da recompensa. Vampire Survivors é um título que se vale dessa relação o tempo todo, tanto no confronto com uma horda que você vê em tela, quanto na questão da movimentação pelo mapa pensando o percurso de caminhos maiores. Ela é o centro de tudo, e é bem satisfatória aqui.Geralmente é necessário sobreviver por 30 minutos em um estágio. A força dos inimigos vai aumentando, bem como o número em que chegam. Há, então, uma urgência em ficar mais forte antes das próximas hordas se aproximarem. Para ficar mais forte, é preciso evoluir e escolher artefatos. Também dá pra conseguir esses artefatos em baús deixados por inimigos do tipo “mini-chefes”. Os pontos de experiência não são adquiridos ao vencer adversários, mas sim ao coletar os cristais deixados por eles. Os baús, por sua vez, também precisam ser coletados.
Dessa forma, a relação constante da jogadora com Vampire Survivors é de avaliar a relação entre o risco de se colocar em uma posição de vulnerabilidade e a recompensa tanto de matar mais e mais monstros, quanto de coletar os cristais para subir de nível. A vulnerabilidade conta pois ser tocado por diversos monstros, mesmo mais fracos, mata o personagem rapidamente (com exceção de situações de fim de run).
A tônica do jogo é compreendida de forma rápida e a resposta também é quase que instântanea. Não passamos o tempo pensando nessa relação entre avanço e recuo, entre ir pra cima e ter cuidado, mas tomamos decisões nesse sentido. Também é central pensar estratégias mais elaboradas da direção em que andamos, se tentamos trazer a horda para cá ou para lá (existem objetos no cenário tanto para ajudar quem joga, quanto osbtáculos para atrabalhar o movimento). Traçar um caminho para acessar cristais, baús e outros objetos no chão é o fator estratégico contextual.
Há, ainda, uma relação de risco e recompensa ao pensarmos o mapa de forma mais extensa: como os inimigos deixam as “moedas” para evoluirmos no exato lugar em que morreram, se preocupar em pegar todas elas acaba sendo um processo que dificulta uma progressão em linha reta. Veja o mapa abaixo.
Em vermelhor teríamos um movimento em linha reta até um artefato extra, não sendo preciso evoluir ou vencer mini-chefes para conquistar. O caminho em vermelho, direto, parece uma boa ideia, mas pressupõe muitos cristais deixados no trajeto, ou mesmo um pouco número de inimigos mortos. A consequência pode ser a morte com a chegada de uma horda mais parruda. O percurso em verde significa a morte de diversos inimigos e a coleta dos cristais, mas sem a conquista rápida de artefatos mais distantes. Esse mapa em específico traz um outro ponto tático, pois os artefatos em azul puxam os cristais do mapa, mas em outros estágios tal item aparece de forma rara e aleatória como drop.
Temos, então, também uma relação entre risco e recompensa mediados pela estrátegia em percorrer distâncias maiores, pelo sistema do relógio (inimigos mais fortes e em grupos maiores chegarão) e pelo único verbo realizado pela jogadora: andar.
É isso mesmo, a única ação comandada por quem joga é o movimento. No meu caso, a partir de um Xbox eu precisei usar apenas o dedo que vai ao analógico ou ao d-pad. Acima mencionei artefatos e armas, e existem muitos personagens. Cada um destes guerreiros começa com uma dessas muitas armas e ao longo da run vai escolhendo outras a partir de três ou quatro opções quando evolui ou automaticamente em um baú. Vampire Survivors traz muitos movesets e equipamentos com efeitos diferentes, mas não precisamos controlar nenhum deles diretamente.
Cada artefato possui um cooldown, e ativa automaticamente assim que este acaba. Veja, eu adoro Final Fantasy e tenho lá minhas mais de 1000 horas em Final Fantasy XIV. Nesse MMORPG, todo o processo de aprendizado em torno de uma classe é saber organizar a rotação das habilidades em torno de seus diferentes tempos de descanso e combos entre si, e apertar as habilidades no segundo possível que já estão disponíveis. Vampire Survivors não traz essa necessidade de usar as armas a partir de um comando pelo simples foto de não ser o foco da experiência direta e concisa proposta aqui.
A partir de diferentes equipamentos, podendo empunhar 6 ou um pouco mais de artefatos ativos, teríamos aí um número razoável de botões, ou a necessidade de navegar entre eles rapidamente. Não é o caso, pois a ação central proposta aqui é a da movimentação e desolcamento pelo cenário enquanto avaliamos nossa estratégia em um constante jogo de risco x recompensa. Vampire Survivors é “editado”, algumas coisas são cortadas para que o foco na relação principal e mais empolgante seja o centro da experiência.
Se você acompanha videogames há algum tempo, principalmente vídeos ou textos mais focados em design, naturalmente associará tal perspectiva ao design por subtração, comumente exemplificado por títulos como ICO e Shadow of the Colossus. Eu acredito que a ideia aqui é mais uma proposta que já era concisa desde o início, do que uma percepção de que era interessante editar e retirar excessos. O próprio criador Luca Galante afirmou em entrevista que a ideia original do jogo era só ser uma parada para relaxar. Parte da graça da experiência é justamente chegar no momento em que é o personagem que destrói as hordas e não o contrário. Ora, uma das frases de venda do jogo está em seu site: seja você mesmo o bullet hell.
Dessa maneira, cada artefato tem seu próprio tipo de ataque e efeito em determinada área: um chicote que acerta a frente em sentido horizontal, raios que caem em um inimigo aleatório, sequências de facas lançadas na direção que o guerreiro está indo, etc. Existem, também, os combos entre artefatos. Elevando o principal deles até o nível máximo, é possível criar a versão aprimorada: são estas que possibilitam a jogadora ser uma verdadeira máquina de matar, praticamente invencível.
Então toda aquela relação de risco e recompensa chega em um momento climático. Chegando perto do fim do tempo do estágio, é possível que estejamos tão fortes que a ação única e própria que temos de fazer, andar, seja algo opcional. Poucas coisas são tão recompensadoras quanto simplesmente parar e ver todos as hordas serem dizimadas pelos artefatos coletados e pela forma correta que jogamos ali. Na primeira vez que isso aconteceu, larguei o controle, bebi alguma coisa, e me senti o verdadeiro “ando devagar porque já tive pressa“.
Entre outras coisas, Vampire Survivors é genial por trabalhar a partir de uma única ação, mas muitas mecânicas, uma relação de avanço e recuo desde o início: em nossa tela, no mapa como um todo, no diálogo com seus sistemas. A recompensa, enfim, é extremamente prazerosa e bem sinalizada. Ir descobrindo as melhores combinações de artefatos, ou mesmo aquelas que nós mais gostamos, é a recompensa final. Sentir que não preciso nem interagir com o jogo, pois desenvolvi bem o caminho até ali naquele estágio, é uma das sensações que mais gostei nesse ano nos videogames.
Comentários
Olha... excelente texto. Esse é um problema que eu já vinha discutindo em meus círculos de amizade ha um bom tempo. Isso fica ainda mais evidente quando percebe-se a necessidade das grandes publishers de seguirem tendencias mais lucrativas não afetam apenas o game design em si, mas também as temáticas, narrativas, e até mesmo a direção de arte dos games. Vide a enxurrada de jogos de zumbis que tivemos na geração passada... Por falar em indies, eu vejo muito potencial para que os próximos AAA inovadores saiam deles. O orçamento ainda é um problema, mas financiamento coletivo já é uma realidade. Acredito que equipes extremamente competentes e comprometidas consigam levantar fundos para levar adiante o desenvolvimento de jogos desse nível.
O sorteio vai ser ao vivo via live???
Obrigado Igor! Seja bem-vindo ao Nintendo Fusion :)
Rapaz, que texto foda! Parabéns Renan! Fico cada mais feliz em ser Nintendista em tempos como esse (apesar de ainda não ter um Switch), saber que a Nintendo rema pesado contra essa maré cheia de lixo. Recentemente o designer da BioWare, Manveer Heir (Mass Effect) compartilhou que a EA só tem foco mesmo nas microtransações, que ainda viu gente gastando 15 mil dolares com cards de multiplayer do Mass Effect 3. Pra piorar agora tem o sistema de Loot Box, que está na moda, e a Warner empolgou com o Shadow of Mordor. Loot Box pra fechar campanha ou pra tentar competir online nos jogos, pra mim isso é praticamente o fim. A única esperança que tenho nessa industria que amo tanto são mesmo nos indies, Nintendo e algumas empresas. Espero que a Activision não estrague a Blizzard, pq apesar de Overwatch ter Loot Box, são completamente cosméticos, e eu acho isso bom até, pq jogar pra desbloquear coisas visuais é muito mais interessante e prazeroso que jogar pra tentar a sorte com um item específico pra ser mais competitivo com upgrades no status do personagem.
Não aparece para você no começo do texto? https://uploads.disquscdn.com/images/b809b035a7e4e21875dfe6af44cc2d10dccbe7c3eea556e1be57fe8018d72a32.png
cadê o tal formulário do Gleam? não vi link nenhum no texto... tá mal explicado isso...
Das publicadoras de games, a EA é sem duvidas a pior. Não foi atoa que foi escolhida como a pior empresa americana por dois anos consecutivos. Não quero parecer um hater, mas é essa filosofia de shooters multimilionários, com gráficos de ponta e extorquimento de dinheiro dos consumidores é que vai fazê-los fechar as portas. Isso fica evidente com o “apoio” da empresa ao Switch, não souberam mais uma vez ler o sucesso do console, e repetem os mesmos erros de uma década: investir pesado em gêneros supersaturados. E é interessante notar como o Iwata foi capaz de enxergar uma realidade mais de uma década á sua frente, e feliz que cada vez mais empresas adotam essa estratégia: jogos de menor orçamento e maior foco no público
Agora sim vou ter meu switch o/
Sim!
Qual é a exceção "imperdoável"? Chrono Trigger?
Reativei minha conta só pra promoção kkkk
Cara, não uso Twitter. Até tenho, mas nem lembro senha nem nada. Vamos ver se tenho sorte
Parabéns à todos nessa nova empreitada, o site é promissor!
Acho que o único defeito desse game foi ter requentado muitas fases, poderia ter sido apenas a GHZ, por exemplo. Mas fora isso é impecável.
sera que agora ganho o
Precisa compartilhar no Facebook. Nos outros lugares é opcional.
Eu preciso compartilhar o sorteio pelo facebook? Ou é preciso compartilhar em outro lugar?
Felipe Sagrado escreva-se em tudo para aumenta a change brother!!!!
Você pode participar sim, só não vai poder obter os dois cupons relacionados ao Twitter. :)
Boa tarde. Eu não uso o Twitter, então gostaria de saber se isso impede minha participação ou só diminui minhas chances?
? vou seguir o Renan aqui tbm